Fruits Basket | O final de um ciclo permite o início de um novo

A vida é feita de ciclos e vínculos, mas, para seguir em frente, é preciso saber o momento de mudar.

Depois de tantos anos de espera, finalmente estamos perto de ver o encerramento de Fruits Basket!

Imagem promocional da terceira temporada de Fruits Basket mostrando da esquerda para a direita: Yuki, Kureno, Akito e Shigure - Otageek
Vínculos negativos precisam ser reformulados.

A primeira adaptação de Fruits Basket, escrito e ilustrado por Natsuki Takaya, foi feita em 2001 pelo Studio DEEN, quando a história ainda não estava finalizada.

Provavelmente foi um dos primeiros shoujos assistido por toda uma geração e marcou muitas pessoas. Por isso, o inesperado remake, feito dessa vez pelo estúdio TMS, aqueceu o coração de tanta gente.

Poder ver o resto da história animada depois de tantos anos e, para quem não leu o mangá, finalmente poder saber o final da história e o destino de tantos personagens queridos, com certeza é muito especial.

É possível assistir todas as temporadas de Fruits Basket e muitos outros animes pela Crunchyroll!

A mesa está posta, o banquete está servido

Alguns dos, se não “os” temas centrais de Fruits Basket, são pessoas, relacionamentos e ciclos. A narrativa nos faz refletir sobre a teia complexa de contatos que formamos em nossas vidas e nos mostra como esses contatos nos afetam e nos transformam de inúmeras formas.

Diferentemente da primeira temporada, que tem um tom bem leve, apresentando-nos aos personagens e a alguns dos mistérios envolvendo os Sohma com calma, a terceira temporada vai direto ao ponto desde o começo.

A mesa está posta, o banquete está servido. Chegamos, finalmente, ao encerramento do (de mais um) ciclo. Três personagens e suas resoluções têm papel fundamental nessa reta final: Kyo, Akito e Tohru.

De certa forma, os três são “forasteiros” dentro das circunstâncias da narrativa. Kyo está “abaixo” dos outros personagens, Akito “acima” e Tohru “de fora”. O incômodo, solidão e não conformação desses personagens com essas posições é de extrema importância para o fechamento do plot.

A Viajante Tola

Honda Tohru sorrindo em cena de Fruits Basket - Otageek
A verdadeira imagem da pureza.

A introdução de Honda Tohru na vida dos Sohma é o acontecimento que tanto dá início à história quanto à sequência de fatos que nos leva ao seu desfecho. Tohru é a peça final do quebra-cabeça, colocada em sua posição tanto pelas mãos do destino quanto pelas mãos astutas e manipuladoras de Shigure, o Cão do zodíaco.

De personalidade doce, bondosa e esforçada, e muitas vezes vista pelos outros por causa disso como tola, Tohru tem a habilidade de ver o bem em todos à sua volta e aceitá-los como são, o que faz com que eles, por sua vez, sejam capazes de ver o bem em si mesmos. Tohru também se importa profundamente com todos à sua volta.

Por si só, isso parece algo de pouca importância. Mas o show nos mostra como, para as pessoas, se perceberem como válidas e merecedoras de amor é um passo extremamente significativo para que deixem de se conformar com suas circunstâncias atuais e sejam verdadeiras consigo mesmas quanto às suas necessidades e desejos.

Os membros do zodíaco desenvolvem uma curiosidade por ela e querem saber quem é essa forasteira que lentamente tem cativado seus iguais. Quase que de forma ritualística, um a um, os doze animais se apresentam para ela no decorrer do show. Eles se deixam transformar um pouco por causa de seu encontro com Honda Tohru.

Honda Tohru sorrindo com cidade ao fundo em cena de Fruits Basket - Otageek

Esse movimento de se envolver com pessoas de fora da família Sohma já estava acontecendo antes. Ayame Sohma, A Cobra, tem Mine Kuramae. Hatori Sohma, depois de um primeiro caso desastroso com Kana Sohma, permite-se envolver com Mayuko Shiraki. E alguns membros do zodíaco criam vínculos entre eles mesmos que são tão significativos quanto o vínculo que têm com Akito, como Isuzu e Hatsuharu e Hiro e Kisa Sohma.

Mas devido às suas circunstâncias, nenhum deles se permite realmente aproximar de outro ser humano. Eles devem amor e lealdade verdadeiros apenas para Akito. A partir do contato com Tohru, porém, isso também começa a mudar. Ela é vetor de pequenas, mas fundamentais mudanças internas e externas nos Sohma.

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Mas ela também tem suas próprias transformações para fazer, sem as quais a história não se completa.

Tohru deseja estar com Kyo. Para isso, precisa aceitar que pode seguir em frente. Precisa aceitar que não deve se prender à sua falecida mãe para sempre. Que tudo bem criar novos laços, novos amores e novas memórias.

Fazer isso não é trair e nem negar o que aconteceu antes. É se permitir ser livre, e, de certa forma, também é libertar Kyo.

O Gato do Zodíaco

Kyo Sohma, o Gato do zodíaco em Fruits Basket - Otageek
Existem coisas que apenas Kyo pode fazer.

Kyo é O Gato do zodíaco, aquele que, desde o início dos tempos, fortaleceu o vínculo de todos os outros membros, justamente por se oporem a ele.

A recusa de manter esse elo eterno é considerado algo tão terrível para os outros que sua “verdadeira” forma amaldiçoada não é a de um gato, mas a de um monstro. A recusa do gato fere profundamente os outros 13, pois é considerada rejeição. Como ele pode rejeitar aquele amor e aquela lealdade que faz tão bem para todos, e que os faz sentirem-se tão seguros? Isso, para eles, é algo monstruoso.

Uma passagem lindíssima do ep. 11 demonstra os sentimentos do Gato em relação ao acordo firmado.

“Deus…Eu não preciso e nem desejo a eternidade. Deus, vamos todos aceitar que as coisas terminam, mesmo quando isso nos aterroriza. Vamos aceitar a mortalidade, mesmo que isso nos faça sentir solitários. Deus, eu tive sorte de estar com você, mesmo que só por um breve momento. Se nós pudermos nos encontrar novamente, após nossa morte e renascimento, então eu quero encontrar “um você” que não sorri apenas ao luar, mas na luz do sol também. Da próxima vez, quero encontrar um você que não sorri apenas conosco, mas com os humanos também”

Gif de Kyo Sohma quando criança em Fruits Basket - Otageek
Essa criança merece ser protegida de todo o mal.

Assim como Akito, Kyo precisa recusar o papel que lhe foi imposto. O papel que moldou seu mundo e suas verdades e no qual ele vem pautando sua vida.

Kyo precisa lidar com o estigma de “ser” uma aberração. Algo tão maligno que causa dor nas pessoas ao seu redor, a ponto de, pela sua perspectiva, fazer elas morrerem. E portanto, alguém digno do enclausuramento que o aguarda.

Foi-lhe dito, desde o começo, que ele era um monstro, e foi tratado assim a vida toda. Excluído, criado longe da sociedade e dos membros da própria família Sohma.

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É apenas quando Tohru demonstra que o aceita por inteiro, inclusive seu lado mais desumano, que Kyo consegue começar a entrar num processo de aceitação. E mesmo após isso, ele ainda tem um longo caminho a percorrer.

Kyo também precisa aceitar que, além de não ser um monstro, existem coisas que apenas ele pode fazer. O mundo não ficará bem se ele não estiver lá. Ele precisa entender e aceitar que é necessário.

Um aspecto interessante de Fruits Basket é que a narrativa mostra muito bem como a mudança não é algo linear e que vem rápido. É um caminho sinuoso, cheio de desconstruções complexas.

No fim, tanto ele quanto todos os outros precisam aceitar exatamente o que o Gato do zodíaco disse no início, pois é o que permite que a maldição se quebre.

Deus, aquela a quem prometeram amor eterno

Akito Sohma, o Deus do zodíaco em Fruits Basket - Otageek
Até mesmo Akito merece a chance de seguir em frente.

Desde os primeiros momentos de vida, foi dito para Akito que ela era especial. Ela nasceu com a garantia de que teria a segurança do amor da família Sohma para sempre.

Seu pai, a pessoa que lhe deu essa garantia verbalmente, faleceu muito cedo. Isso fez com que Akito percebesse, talvez inconscientemente, a fragilidade da realidade que lhe prometeram.

Não muito tempo depois, a maldição de Kureno Sohma, O Galo, quebrou, reforçando ainda mais sua sensação de insegurança. Não por um acaso, ela mantém Kureno constantemente ao seu lado, ou como uma reafirmação de que, mesmo com a maldição quebrada, ela não seria abandonada, ou como uma negação da possibilidade da quebra da maldição.

Akito cresceu dona de imenso poder que exerceu de forma irresponsável e tirânica, machucando profundamente todos a sua volta. Ela precisava acreditar e reforçar para si mesma a ideia de que estava acima de todos, de que possuía todos. Agia assim porque dentro de si existia uma criança apavorada.

Mas fica evidente que tanto poder e a forma como ela lida com ele, por um lado, era uma garantia de nunca estar sozinha. Por outro, também era algo que nunca permitia que realmente estivesse com os outros.

Akito permite que Tohru se aproxime da família Sohma para provar para si mesma que não existia a possibilidade de alguém de fora abalar os laços entre os membros do zodíaco. Ela também queria provar para eles que ninguém de fora da família seria capaz de formar vínculos reais e que, eventualmente, Tohru acabaria por rejeitá-los.

Como fez com todos os outros, Tohru é aquela que estende a mão à Akito. Não se senta nem acima nem abaixo, mas ao lado dela. Tohru a vê como igual, alguém que tem tantas falhas e é tão humana quanto ela. E nesse momento, o ciclo se completa.

Após todas essas transformações, mesmo com medo, Akito é finalmente capaz de libertar a si mesma e aos outros Sohma. Muita gente até questiona se essa redenção de Akito, depois de todas as atrocidades que ela cometeu, é merecida ou não.

É, com certeza, um argumento delicado de se fazer, mas, dentro dessa escolha narrativa, está a essência de Fruits Basket.

A narrativa deixa claro que as pessoas que foram machucadas não têm a menor obrigação de perdoar e tem todo o direito de guardarem ressentimento pelo tempo que for necessário, até odiarem se for o caso. Mas isso não anula a ideia de que todos têm a possibilidade de mudar e seguir em frente. E essa é uma ideia muito tocante.

No fim, a série aponta o “verdadeiro vilão” como Ren, a mãe de Akito (assim como muitos outros pais são apontados como responsáveis por impor imenso sofrimento a seus filhos na história). Mas se você seguir a lógica da história, vai perceber que, com certeza, as ações de Ren provavelmente também são “justificáveis” e vêm de algum lugar, assim como a de todas as pessoas.

Talvez Fruits Basket queira mostrar que o verdadeiro vilão é a estagnação, a perpetuação de um padrão mantido pelo medo. Logo, a “salvação” vem através da quebra do ciclo, de estabelecer limites, do perdão.

Depois de séculos em repetição, honrando um acordo que inicialmente foi feito em nome do amor e da lealdade, os membros do zodíaco são obrigados a se sentar, reavaliar e aceitar que está na hora de cada um seguir seu próprio caminho. Ou de seguirem juntos, mas de uma forma diferente.

Talvez seja um pouco ousado da minha parte afirmar que todos nós temos, mesmo que às vezes, um pouco de Akito em nós, e está tudo bem. Todos nós somos a criança machucada, apavorada e egoísta. Mas também está em nós a capacidade de nos acolher, de nos libertar, de mudar e de nos permitir seguir em frente, como Honda Tohru.

E é isso. O mundo gira, as coisas e as pessoas mudam, mesmo que lentamente. E a história segue.

Prova disso é que a autora Natsuki Takaya escreve a história dos filhos dos protagonistas em Fruits Basket Another, mostrando novamente que os ciclos e os laços seguem se retorcendo e se transformando eternamente.

Momiji Sohma com uma toalha na cabeça em cena de Fruits Basket - Otageek

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