‘Breaking Bad’: 15 anos de mudança na televisão 

‘Eu achava que seria o maior fracasso’, confessa o criador da série
A dupla icônica Jesse Pinkman (Aaron Paul) e Walter White (Bryan Cranston). Foto: AMC/Divulgação

A 15 anos atrás, ‘Breaking Bad’ chegava na TV americana pelo canal AMC. Antes disso, o roteiro havia sido apresentado para outros canais americanos, como a TNT, Showtime e FX. Na época, até a HBO rejeitou o roteiro. O que todas essas empresas não sabiam, era do potencial narrativo que a obra carregava e que, 15 anos depois, estaria marcada como uma das séries mais renomadas da televisão americana. 

Em suma, a história de ‘Breaking Bad’ é simples: um professor de química do ensino médio é diagnosticado com câncer de pulmão, o que o leva a decisão de entrar no mundo das drogas e, assim, de alguma forma conseguir ajudar sua família após a morte. 

Uma volta no passado

É inegável pensar no sucesso de ‘Breaking Bad’, e não relacionar com outras obras de renome que a antecederam. Em meados dos anos 90, começava o que hoje ficou nomeado pela ‘Terceira Era de Ouro da Televisão‘. Foi a época em que a HBO mudou os rumos e dogmas do que se pensava até então sobre televisão. No período, destacam-se ‘Os Sopranos’, ‘Mad Men’, ‘Lost’ e, claro, ‘Breaking Bad’. Todas eram obras categorizadas pelo ar dramático, marcadas por características ambíguas. 

‘Os Sopranos’. Foto: HBO/Divulgação

Os novos anos dourados da televisão traziam em foco o que se pode chamar de ‘Homens Difíceis’, seguindo os parâmetros da obra de Brett Martin. Esses personagens vinham rompendo com a convenção de que protagonistas de ficção seriada televisiva precisariam sempre ser simpáticos. Os executivos acreditavam que os espectadores não iriam se interessar em acompanhar a vida de foras da lei e, dessa forma, as séries televisivas precisavam envolver personagens que provocariam reconhecimento e empatia para quem assistia. Foi na década de 80, que essa convenção passou a enfraquecer. 

Inúmeras produções abriram espaço para que em 1999 a HBO lançasse ‘Os Sopranos, produção que acompanhava o dia a dia do mafioso Tony Soprano. O sucesso da série é tido para muitos autores como o início do ‘boom’ de dramas com anti-heróis no protagonismo na televisão norte-americana. O mafioso foi seguido pelo serial killer Dexter Morgan e pelo publicitário Don Draper em ‘Mad Men’. A questão é que personagens como esses, com características transgressoras, eram reservados aos papéis de vilões. Dessa forma, as características de bom e mau foram fundidas, e assim, convidavam o telespectador a embarcar na jornada. 

‘Dexter’. Foto: Showtime/Divulgação

A narrativa do anti-herói nos estimula a torcer pelo personagem inerentemente mau, que pratica atos questionáveis. Dessa forma, o espectador firma alianças morais ambíguas com esses indivíduos, como por exemplo, torcer para que Dexter Morgan não seja pego pela polícia.  A familiaridade entre ambos, permite que o espectador concorde e justifique os desvios éticos do anti-herói. O conhecimento de informações íntimas também é um fator. A narrativa de ‘Breaking Bad’ apresenta um Walter White (Bryan Cranston) preocupado com sua família, que toma decisões moralmente incorretas pelo bem financeiro da esposa e do filho. É na progressão da narrativa, em que Walter se transforma em um personagem movido pelo poder. E, a essa altura, o telespectador já se afeiçoou pelo mesmo. A peculiaridade é que, apesar de obras como essa já terem sido exploradas pelo cinema, era novidade a produção na televisão, veiculadas em horários de grande audiência e consumida por uma gama de indivíduos. 

A reviravolta na personalidade de Walter White era uma aposta diferente no que a televisão proporcionava até então. A série colocava um trabalhador comum, um pai de família, como um transgressor da lei. Ainda por cima, alguém que agora fazia parte de um esquema de drogas da região. Enquanto lidava com o câncer recém descoberto, sem contar nada pra família, Walter ainda precisava garantir o sustento com o pouco dinheiro que ganhava. Para ajudar, tinha um trabalho desvalorizado, uma esposa grávida e um filho com paralisia cerebral para sustentar.

A série, torna-se assim, uma forma de arte digna, terreno até então ocupado unicamente pelo cinema. Enquanto Hollywood apostava em uma onda de franquias e blockbusters, os canais de televisão buscaram a inovação no âmbito criativo. Vince Gilligan, em um evento comemorativo dos 15 anos da série, onde o Otageek marcou presença, afirmou que ‘Breaking Bad’ não existiria sem Tony Soprano. Na época, a HBO investiu em produções originais que iriam, de certa forma, marcar as percepções do público e revelaram-se produtos representativos de amadurecimento. Até hoje, a empresa mantém a fórmula que deu certo. Os números estão aí para provar. ‘Game of Thrones’, ‘House of the Dragon’ e ‘The Last of Us’ são alguns dos exemplos.

Desde o início, ‘Breaking Bad’, foi concebida com começo, meio e fim. Seriam cinco temporadas que evidenciariam o declínio de Walter White. Inicialmente, Gilligan planejava matar Jesse Pinkman (Aaron Paul), e mostrar a decadência solitária de Walter. Entretanto, ao notar a química inegável entre ambos, decidiu manter o ator no elenco. “Bryan Cranston foi o motivo pelo qual ‘Breaking Bad’ se tornou o que é. Ele é um personagem ruim, e conseguiu gerar empatia, fez com que as pessoas gostassem do personagem. Ele conseguiu isso juntamente com Aaron Paul. Se tem uma dupla perfeita, e um ingrediente perfeito, são os dois. Eles conquistaram o sucesso da série”, relatou Gilligan. 

É comum as produções se entregarem ao jogo do lucro em Hollywood. Afinal, longevidade é grana na televisão. Quem não se lembra do declínio de ‘Dexter’?. Com ‘Breaking Bad’ a proposta foi diferente. Gilligan sabia que a série precisava das cinco úteis temporadas para formar seu arco narrativo. São poucas as produções que reconhecem seu prazo de validade. Até hoje, tal escolha ainda é respeitada pelo diretor. Ele não pretende trazer a série de volta. Em suas palavras, quer cuidar do legado de ‘Breaking Bad’

Sucesso de audiência

Mesmo com tantos traços de brilhantismo, a série que estreou sem nenhuma celebridade, se firmou na audiência apenas na quinta temporada. ‘Breaking Bad’ foi uma das primeiras a se aproveitar do fenômeno dos streaming. Apesar de ser elogiada desde o início, não era um sucesso no número de telespectadores. Foi quando chegou na Netflix, com a oportunidade dos fãs de maratonar, que cresceu ano após ano. De acordo com um relatório da Nielsem, a produção foi a quarta série de televisão online mais assistida em 2013, com média de 3,4 milhões de visualizações por episódio em serviços de streaming como a Netflix.“Acredito que a Netflix nos manteve no ar”, disse Vince Gilligan, no Emmy de 2013. 

Vince Gilligan, criador de ‘Breaking Bad’

Assim, Walter White foi aclamado como um ícone cultural. A qualidade técnica da série é demonstrada pelas suas 200 indicações a prêmios e seus mais de 150 prêmios recebidos em diferentes categorias. Até hoje, ‘Breaking Bad’ marca uma representação na mudança da televisão. Mudança essa que foi preparada por outros programas com anti-heróis em cena. “‘Breaking Bad’ mudou minha vida. Nunca pensei que fosse uma série tão bem sucedida com fãs no mundo todo, e que seria revista 15 anos depois. Há 15 anos, eu pensei: ‘vou fazer um piloto e depois vou fazer outra coisa, ninguém vai gostar dessa série, acho que vai ser o maior fracasso’. Creio que o timing de ‘Breaking Bad’ ajudou muito no sucesso. É como se eu tivesse ganhado na loteria”, concluiu o diretor. 

Exclusivo

Na última sexta-feira (28), o Otageek participou do evento de comemoração aos 15 anos de ‘Breaking Bad’ com a participação de Vince Gilligan, a convite da A&E. A partir do dia 17 de julho, em homenagem a data, a premiada série de drama será exibida completa no canal, de segunda a sexta. 

A série retorna pelas mãos do A&E para reviver a história e os momentos épicos da produção que se tornou um fenômeno cultural. ‘Breaking Bad’ foi exibida em mais de 170 países, mencionada em inúmeros filmes, séries de TV e outras mídias, além dos seus 16 prêmios Emmy. “Estamos empolgados em trazer ‘Breaking Bad’ de volta em seu 15º aniversário”, disse Carmem Larios, vice-presidente sênior de conteúdo do A&E. “A série continua tão relevante e emocionante, e mal podemos esperar para apresentá-la a uma nova geração de telespectadores, bem como aos fãs que desejam reviver este ícone da televisão.”

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Isabella Breve
Isabella Breve

Graduanda em Jornalismo, leitora voraz, amante da Sétima Arte e eternamente fã.

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