São Jorge e o Dragão – As Releituras Geek do Mito

Muita gente tem como totem o ícone de São Jorge. Estar “vestido com as roupas e as armas de Jorge” é motivo de orgulho. Mas vamos analisar mais atentamente esse hieróglifo da Igreja Romana.

Muita gente tem como totem o ícone de São Jorge, o “Santo Guerreiro” que, galopando seu alazão, subjuga a figura desprezível do dragão. Estar “vestido com as roupas e as armas de Jorge” – um centurião romano, garoto-propaganda do credo bélico de Roma – é motivo de orgulho. Mas vamos analisar mais atentamente esse hieróglifo da Igreja Romana.

Imagem de São Jorge e o Dragão

Segundo a hagiografia¹ da Igreja Católica Romana, São Jorge teria nascido em Lida – atualmente situada em Israel – e era soldado do exército do Imperador Diocleciano. Teria morrido na Nicomédia (hoje, Izmit, na Turquia) e seus restos mortais transferidos para sua terra natal pelo Imperador Constantino, que mandou construir uma igreja-mausoléu em sua homenagem. Considerado padroeiro de diversas cidades ao redor do mundo e padroeiro não-oficial do Rio de Janeiro – título originalmente atribuído a São Sebastião – a figura mítica de São Jorge, no entanto, remete a períodos históricos anteriores ao cristianismo.

A Diáspora do Ícone

Uma das primeiras manifestações iconográficas semelhantes de que se tem notícia data do Livro Egípcio dos Mortos, onde uma figura desprovida de nomenclatura fere uma serpente com sua lança. Na Índia, Krishna subjuga a serpente antropomórfica Kaliya.

Krishna pisoteia as cabeças de Kalyia em seu sapateado celestial, tal qual São Jorge.
Krishna pisoteia as cabeças de Kalyia enquanto dança.

Atentem para o fato de que Krishna (assim como São Jorge), subjuga seu próprio dragão pisoteando-o. Quase todos os mitos que subjugam sua própria besta por intermédio da truculência possuem um intermédio, um anteparo; por vezes um símbolo fálico. Do ponto de vista do gênero, o arquétipo masculinopositivo, “do bem” deve subjugar o femininonegativo, “do mal”. Do ponto de vista do gênio humano, este deve submeter o Instinto à Razão, que deve ser superior à Emoção.

Esses arquétipos são sempre representados por um guerreiro, trajado em vestes bélicas, muitas vezes em uma montaria que lhe serve de veículo. O adversário é sempre representado como uma serpente ou figura reptílica, mas não em seu aspecto de autorrenovação, por mudar de pele, ou de abrangência (já que seu corpo longilíneo pode envolver qualquer objeto em circunferência, inclusive o mundo), mas por seu aspecto rasteiro, baixo, ao revés, à mercê.

No antigo Egito, o deus Osíris é traído e atraído para um banquete por seu imão Seth, a serpente (embora seja antropomorfizado com a cabeça de um cão) ou “o vento cortante” do deserto, que o castra e esquarteja, lançando seus pedaços ao longo do Rio Nilo. Osíris representa o Sol, o aspecto masculino e viril. Seus pedaços são lançados ao longo do leito de um rio, sinuoso como qualquer serpente.

Osíris é esquartejado por seu irmão Seth.
Osíris é esquartejado por seu irmão Seth.

Ísis, deusa da fertilidade, chora a morte de seu marido-irmão e suas lágrimas se transformam em abelhas, não só porque polinizam flores, mas porque, em seu voo, formam a gestalt (forma) de lemniscatas, o signo do infinito. Chamo de signo em vez de símbolo devido à Lógica dos Signos e Símbolos, de C.S. Peirce.

Ísis chora a morte de Osíris.
Ísis chora a morte de Osíris.

Com a ajuda de Sobek, o deus com cabeça de crocodilo, Ísis consegue juntar os pedaços de seu falecido irmão-marido. Mais uma vez, há a associação do aspecto feminino com o reptílico e dele com o aspecto aquoso, como veremos mais adiante. Ísis não consegue reaver o falo de Osíris (o que representa a perda de seu poder) e preenche a lacuna com seu polegar. Hórus, seu filho póstumo, vai tirar satisfação com seu tio Seth, o que configura mais uma vez a batalha contra um réptil.

Na mitologia grega, o herói Belerofonte², filho de Poseidon, cavalga um pégaso e subjuga a Quimera. O pégaso mesmo teria emergido do mar após a morte de Górgona por Perseu, tal qual Afrodite após Cronos atirar o falo de Urano em Oceano.

Logo, Pégaso representa também um arquétipo feminino. Com sua ajuda, Belerofonte pôde não só derrotar a Quimera, mas vencer as Amazonas. Segundo o professor Junito de Souza*, Zeus o nomeou “o portador do trovão e do raio”, o que faz Belerofonte próximo de Thor e Xangô.

Belerofonte e Pégaso, na pintura de jan Boeckhorst. Note a semelhança com São Jorge.
Belerofonte e o Pégaso, no pincel de Jan Boeckhorst.

O cristianismo, como religião patriarcal e consequentemente falocrática, imprimiu na psiquê ocidental uma noção hierárquica vertical. O detentor do poder deve ostentar um cetro que representa seu poder coercivo, consequentemente castrador. Osíris, ao morrer no deserto, tem, em algumas versões, seu falo arrancado por seu invejoso irmão Seth, enquanto, na mitologia grega, Urano é castrado pelo titã Cronos por ter dado origem, com sua criatividade, ao universo.

O professor também menciona que: “O simples cavalo figura tradicionalmente como a impetuosidade dos desejos. Quando o ser humano faz corpo com o cavalo, torna-se um monstro, o Centauro, identificando-se com os instintos animalescos. O cavalo alado, muito pelo contrário, simboliza a inspiração criadora sublimada e sua elevação real.” 

O cavalo de São Jorge não possui asas, não só para que a única figura inverossímil da imagem seja apenas o Dragão (conferindo-lhe um ar de pouca credibilidade, e, portanto, demoníaco), mas também porque “São Jorge” é uma versão de Belerofonte castrado de sua subjetividade. “Belerophonte” significa Fonte de Poder. Mais tarde, acrescentou-se à lenda que São Jorge matou o Dragão em uma batalha na lua, plagiando a “cena” em que o herói grego sobe ao Olimpo.

A diferença é que Shiva, o Destruidor (ou Transformador), subjuga a famigerada Serpente através da Vontade, não pela coerção ou pela força bruta. Ele possui a Serpente calmamente enroscada em torno de seu pescoço. Ti´âmat** é a Deusa Dragão do Caos e das Trevas; o Abismo, as águas salgadas, mas que dá à luz o Mundo. Mistura-se à Apsu, as águas doces, e resgata sua completude, já que havia sido dividida pela lança de Marduk³.

Marduk e Tiamat - gravura do livro Dragão, de Francis Huxley
Marduk e Ti´âmat – Dragão (Francis Huxley).

O mítico “São Jorge” é, na verdade, um plágio de Belerofonte, montado num cavalo e subjugando sua própria Quimera. O arquétipo do homem dominando a besta deu lugar a um mito de coerção. Não esqueçamos que a palavra “quimera” derivou para um adjetivo que designa sonhador, fantasista, sem fundamento, ilusório, utópico. Matar o sonho é castrar a subjetividade.

E como subjetividade não pode faltar para nós otageekers, vamos às versões pop do mito, que mostraram o arquétipo de modo quase imperceptível e evocaram-no do inconsciente coletivo do grande público de forma praticamente subliminar.

Parafraseando Djavan: “São Jorge, por favor, liberte o Dragão!”

Transmídia Arquetípica: As versões POP do Mito

Mesmo nas formas mais sutis, o arquétipo de São Jorge e o Dragão está presente. A figura mais próxima ao ser humano possui sempre um aparato bélico, enquanto sua besta particular se encontra sempre desprovida de armamento e o que faz dela um perigo é ela própria.

Muitas vezes, o herói não foi preparado para aquela missão e seu dragão particular aparece como um deux ex machina em sua saga para confrontar-lhe de uma forma que nem o seu arqui-inimigo algum dia fez. Vamos aos casos mais conhecidos:

King Kong vs Godzilla (2021)

Desde o seu primeiro filme, Kong enfrenta um réptil gigante à sua altura. Seu aspecto variava de acordo com a época. Tivemos um tiranossauro no clássico de 1933, uma serpente gigante na refilmagem de 1976, novamente tiranossauros em 2005 e os estranhos skullcrawlers em Kong: A Ilha da Caveira (2017). Só faltava Kong enfrentar um dragão.

Kong parte para o ataque munido de uma machadinha feita de um cristal desconhecido oriundo do centro da Terra oca, lembrando São Jorge.
“Eu tenho a força!”

Em Godzilla vs Kong (2021), o macacão (macaco não, símio), que já perdeu o título de rei logo no título, teve a chance de bater de frente com o Rei dos Monstros, recém-coroado em seu filme anterior. Como todo São Jorge precisa de uma espada, lança ou arma, Kong vivencia uma parábola alquímica ao descer ao centro da Terra para conseguir um machado, sua Pedra Filosofal.

Ultraman, Ultraseven, Spectreman, robôs do gênero Mecha vs Kaijus

Ao fazer contato com uma entidade superior, um indivíduo se torna um robô de 50 metros de altura, geralmente nas cores vermelho e cinza (as mesmas de São Jorge), para enfrentar criaturas gigantes e medonhas, verdadeiras quimeras, híbridas de várias espécies formando um amálgama bestial. Não raro, tinham formas reptílicas. Isso acontece nas séries de Ultraman, Spectreman, em animes como Robotech (1985) e na recente franquia Círculo de Fogo (2013) e Círculo de Fogo: A Revolta (2018).

Ultraseven ou algum outro Ultra enfrentando um kaiju, como uma espécie de São Jorge.
Ultra… quem?!

A mais famosa delas, embora não faça parte do universo de Ultraman, é Godzilla, único personagem que conseguiu alcançar a hegemonia de protagonista personificando um dragão. Seu genérico, Spectreman, em um episódio, chega a enfrentar a Salamandra, que cuspia fogo. Precisa de mais?

Superman vs Apocalypse

Todos reclamavam que o Superman era um semideus e não poderia jamais se dar mal pra valer em uma história, o que fazia com que o personagem estivesse gradativamente perdendo sua popularidade.

Superman, mundido de uma armadura fornecida pela Caixa Materna, esmurra Apocalypse em Super-Homem Versus Apocalypse - A Revanche.
Superman em seu momento São Jorge.

Para pôr em xeque sua invulnerabilidade, a DC Comics lançou mão de um deus ex machina para tirar o protagonista da mesmice. Assim, Doomsday, como é chamado nos EUA, sai da terra com uma das mão atadas (assim como o Invunche, de Monstro do Pântano) e desce o braço no Super, literalmente com uma mão nas costas. O nome verdadeiro do Super-Homem não é Clark Kent, seu nome adotivo, mas Kal-El. “El” vem das letras hebraicas Aleph e Lamed e significa algo como “do Céu”, ou “Celestial.”

Batman vs Bane

Mesmo o soturno personagem que nada tem de celestial tem um quê de São Jorge. Batman possui um aparato bélico de ponta, embora não letal, pois, assim como Jorge, é um paladino da justiça. Mas o que ninguém esperava é que seu dragão não seria seu zênite, Coringa, mas um brutamontes criado de última hora. Pensando bem, Bane personifica bem mais o dragão.

Bane ostenta Batman derrotado em A Queda do Morcego (1993), tal qual o dragão de São Jorge

Embora não tenha aparência reptílica, sua força bruta o aproxima da imagem de besta e sua história o faz emergir de um ambiente infernal, que o obrigava a rastejar (viver de forma subserviente), tanto na HQ quanto em sua versão para as telonas. De quebra, seu poder vem do anabolizante que tem o sugestivo nome de Veneno.

Batman vs Crocodilo

Crocodilo, ou Killer Croc, no original (ao contrário do Lagarto, da Marvel, que veremos a seguir), já nasceu com a aparência reptílica. Abandonado por seus pais por esse motivo, teve que se virar pra viver “como manda o dia-a-dia,” tornando-se gangster no início de carreira.

Batman enfrenta Crocodilo como uma espécie de São Jorge

Tendo sofrido na época em que bullying ainda se chamava “zoação,” Croc quase matou seu algoz juvenil, o que o levou a um reformatório. Já vimos essa história muitas vezes, inclusive – e principalmente – na vida real, não é, otageekers? Mais uma vez o Dragão foi admoestado e respondeu à altura. À medida que se tornava mais velho, seu ódio pela humanidade crescia, bem como sua aparência bestial. Algo próximo do(s) personage(ns) Dr. Jekyll & Mr. Hyde, d’A Liga Extraordinária. Oops! Spoilers

Homem-Aranha vs Lagarto

Dr. Curt Connors inventou uma fórmula reparadora baseada na autotomia (capacidade de regenerar um membro amputado) dos répteis para regenerar seu braço perdido.

Homem-Aranha enfrenta Lagarto no esgoto, como São Jorge.

Ele não sabia que isso o faria mudar para uma forma humanoide reptílica, conhecida a partir de então como Lagarto. A metamorfose para um “dragão” se dá a partir de um médico – um doutor – enunciando a perda da razão.

Thor vs Jormungand

Thor, assim como Belerophonte e seu pégaso, é o portador do trovão e do raio, simbolizados por seu martelo, Mjolnir. Thor enfrenta Jormungand, a “serpente que envolve o mundo” em várias edições, inclusive no prólogo de Thor: Ragnarok (2017).

Thor enfrenta Fin Fang Foom em sua forma de Jormungand em Superalmanaque Marvel 4. Novembro de 1991

Em Superalmanaque Marvel #4 (novembro de 1991), na fase lendária de Walt Simonson, após sair muito maior de sua casca, Fin Fang Foom, agora Jormungand, pode envolver todo o globo terrestre, até seu focinho alcançar sua cauda (tal qual Ouroboros, a Serpente que Morde a Própria Cauda). Ao menos é o que ela diz, na sua eloquência desnecessária.

Homem de Ferro vs Fin Fang Foom

Tony Stark se f(…) deu mal na guerra do Vietnã, e teve o coração partido pelos estilhaços de uma granada. Sendo obrigado a desenvolver uma arma para o líder guerrilheiro Wong Chu, acaba criando sua primeira armadura, com a ajuda do cientista chinês Yinsen.

Homem de Ferro versus Fin Fang Foom

Como todo São Jorge precisa do seu Dragão pra ter graça, com o Homem de Ferro não poderia ser diferente. Fin Fang Foom teve sua primeira aparição em Strange Tales #89 (1961), e sua origem revelada em Homem de Ferro #261 (1990), na fase de John Byrne.

Seu nome significa algo como “Aquele cuja respiração estilhaça as montanhas e cujas costas arranham os céus,” (embora Fin seja também “barbatana” e “Fang” “presa” em inglês e “lugar” em chinês), já que possui cerca de 9 mil e setecentos metros de comprimento e aproximadamente 13 mil de envergadura.

A primeira aparição de Fin Fang Foom em Strange Tales 89 (1961)

Foom tinha sido adormecido por uma potente erva, tendo acordado ao menos uma vez durante o século VIII. Em 1961, durante o regime comunista, um adolescente chamado Chan Liuchow acordou a criatura para combater o regime e a fez dormir novamente através da mesma erva. Que erva terá sido essa?

Ripley vs Rainha dos Xenomorfos Aliens, O Resgate (1986)

Desde que surgiu nos cinemas, em Alien (1979), a criatura alienígena conhecida como xenomorfo sempre teve um formato esquelético que não poderia ser aludido a nenhuma classe taxonômica da biologia: mamífero, réptil, anfíbio ou afins.

Ripley enfrenta a rainha alien com um exoesqueleto em Aliens: O Resgate (1986), tal qual São Jorge.
Ripley em seu momento belereofôntico.

Sua forma de reprodução lembra a de alguns insetos, mas sua espinha dorsal, as cenas em que aparece nadando em Alien: A Ressurreição (1997), e sua movimentação sinuosa o tornariam próximo a um réptil, o que fica evidente em alguns games, quando o loading é representado pelo xenomorfo girando em torno de si mesmo tal qual Ourobouros. O xenomorfo quadrúpede que aparece em Alien 3 (1992) é chamado The Dragon.

Close da batalha de Ripley com a rainha alien. Aliens: O resgate (1986)
Ai, ai, ai… !

Em Aliens, O Resgate (1986), Ripley acaba pilotando um exoesqueleto para enfrentar a Rainha Alien, que nos é apresentada pela primeira vez no cinema. O tamanho da rainha, além das características reptílicas supracitadas fazem dela o Dragão, enquanto Ripley, no papel que lhe cabe, precisa do aparato bélico a seu favor para enfrentar a criatura bestial.

Alien versus Predador

Ainda que ambos tenham traços reptílicos, a figura do Predador nos é mais humana: dois braços, duas pernas, domínio do polegar opositor, postura ereta, vestuário, linguagem articulada…

Alien vs Predador, mostrando Alien como mais humanesco na posição de São Jorge

Já o Alien nos lembra vários bichos, sempre rastejantes, hora reptílicos, hora insectoides. Não possuem linguagem articulada, cultura, roupas e se comportam como uma colmeia. É novamente a razão contra o instinto; a tecnologia contra a natureza.

Os Heróis de Caverna do Dragão versus Tiamat

Os heróis de Caverna do Dragão, animação de grande sucesso nos anos 1980, tinham como zênite o famigerado Vingador, que montava, não um cavalo alado, já que era ele que possuía asas. Tanto que ficava a dúvida: se o Vingador abrisse as pernas, o cavalo cairia?

O dragão Tiamat sendo confrontado por heróis em ilustração
Tiamat em versão RPGística.

Mas não é essa visão degenerada de Belerofonte que nos interessa, mas Tiamat, o dragão de cinco cabeças, que tornou o mito mundialmente conhecido, embora quase ninguém saiba que ele possui seu próprio São Jorge, Marduk. A animação foi inspirada no RPG Dungeons & Dragons, que nos apresenta Tiamat como uma mulher, a Rainha dos Dragões Malignos.

NOTAS:

* Junito de Souza Brandão (1924-1995) foi professor e escritor; bacharel em Letras Clássicas pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade do Estado da Guanabara (UEG). Lecionando na PUC-Rio, criou a Cadeira de Mitologia Grega e Latina para o Currículo de Letras desta Universidade.   

** Tal nomenclatura é dada no livro Androginia, Rumo a uma Nova Teoria da Sexualidade, da psicóloga junguiana Jung Singer.

1- Hagiografia – Ramo da História responsável por catalogar a vida de santos e beatos, além de suas virtudes supostamente “heroicas”. É uma prática mais comum na Igreja Católica Romana, que a considera uma ramificação da História da Igreja.

O termo deriva do grego hagios, “santo” e graphía, “escrever.” Originou-se por volta do século XVII, alegando ter como objetivo catalogar os diversos escritos a respeito dos santos. Autenticando textos não necessariamente históricos, acabou por repaginar deuses pagãos convertendo-os em ícones de devoção.

2- Belerofonte, tal qual Caim, matou seu irmão. Daí o seu nome “aquele que matou Belero”, segundo algumas fontes. Após ter matado a Quimera sem dificuldade, tentou voar ao Olimpo, “fato” que deu origem à lenda de São Jorge combatendo o Dragão na lua. No entanto, foi amaldiçoado por Zeus, que enviou uma vespa para que picasse o Pégaso. Atena tornou o chão macio mas Belerofonte, aleijado, passou o resto de seus dias coxo, peregrinando atrás de seu alazão alado. 

Fonte: Mitologia Grega, Volume I; Junito de Souza Brandão – Editora Vozes

2.1- Ogum, de forma semelhante, foi castigado por Oxalá por ter maltratado todas as suas companheiras. Devido à sua misoginia, foi condenado a vagar para sempre nas estradas, ajudando aqueles que se perdem, pois jamais encontraria seu caminho. 

Fonte: Orixás na Umbanda; Janaina Azevedo; Editora Universo dos Livros

3- Marduk, outro chauvinista convicto, dividiu ao meio Ti´âmat, a “Deusa Dragão do Caos e das Trevas”. De suas lágrimas surgiram os rios Eufrates e Tigre, e de seu corpo formou-se a humanidade. Esse “feito” marca a passagem do matriarcado para o patriarcado. De forma semelhante, Apolo matara Píton, ato do qual derivou o Oráculo de Delfos, que abrigaria as Pitonisas, tão bem representadas no filme 300

Fonte: Androginia, Rumo a uma Nova Teoria da Sexualidade; June Singer – Editora Cultrix

4- Yin-Yang – Na verdade, as diversas versões do mito são formas maniqueístas de se enxergar a dualidade, tão bem proposta na figura do Tao. Em árabe, Al Hayyah, “a Serpente”, está relacionado a Hawwah, que é também o nome hebreu de Eva, a mãe universal.

Fonte: O Dragão; Francis Huxley; Edições Del Prado

Qualquer deus ou mortal só pode nascer quando se abre “as mandíbulas de sua prisão”, ou seja, a vagina; o que nos leva a:

5- Nanã Buruku, que ao ver o insucesso de Oxalá em tentar criar o ser humano, criou-o, ela mesma, através da Lama Primordial, à qual todos deverão regressar no momento de sua morte.

Fonte: Orixás na Umbanda; Janaina Azevedo; Editora Universo dos Livros

Este artigo foi publicado originalmente no blogue Cinegnose, porém com uma abordagem um pouco diferente e menos completo. Que “Salve, Jorge” que nada! Salvem o Dragão!

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Claudio Siqueira
Claudio Siqueira

Escritor, poeta, Bacharel em Jornalismo e habitante da Zona Quase-Sul. Escreve ao som de bits e póings, drinkando e smokando entre os parágrafos. Pesquisador de etimologia e religião comparada, se alfabetizou com HQs. Considera os personagens de quadrinhos, games e animações como os panteões atuais; ou ao menos, arquétipos repaginados.

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