Quando um tira onda com outro nas HQs!

Nem sempre é porrada! Às vezes, um personagem apenas tira a maior onda com a cara do outro.

Um dia é da caça, o outro é do caçador. A máxima reflete bem o assunto que vamos abordar agora. Não é novidade que grande parte das tramas retratadas nas HQs se resumem em confrontos entre os personagens, seja o tradicional herói protagonista contra seu estimado arqui-inimigo ou mesmo herói contra herói, o que pode resultar em verdadeiras humilhações.

Neste caso, pode ser em um primeiro encontro não muito amigável, resultando em uma aliança entre ambos, ou fruto de propósitos diametralmente opostos. No caso dos vilões, estes se digladiam por um objetivo em comum ou alguma aliança que deu errado.

E os anti-heróis… Bem, estes costumam selar uma aliança com os heróis em prol de um objetivo supostamente comum, mas acabam não se entendendo e seguindo caminhos opostos ao final da trama. O fato é que esses encontros nem sempre se dão na forma de embates, mas simplesmente um personagem tira a maior onda com a cara do outro. A seguir, algumas das melhores picuinhas entre nossos velhos conhecidos:

O Mimimi de Mephisto 

Surfista Prateado – O Juízo Final (1991)

Atrás de conseguir a alma mais pura do universo (a do Surfista Prateado, claro), Mephisto resolve usar a personagem Nova (que na época ocupava o cargo de arauta de Galactus) como moeda de troca. É que a dita cuja era apaixonada pelo Surfista e Mephisto a seduz com uma promessa do tipo “Trago a pessoa amada em três anos-luz”. Pessoinha peçonhenta como é, Mephisto aprisiona Nova em seu reino e o Surfista desce ao inferno em seu auxílio.

“Laranja madura, na beira da estrada, ou tá bichada, Zé, ou tem marimbondo no pé…”

Como condição para libertá-la, o vilão reclama o próprio Surfista… de corpo e alma. Como é torpe de valores nobres, nosso herói cromado aceita ficar preso por toda a eternidade, cabendo ao seu antigo mestre, Galactus, resgatá-lo, após os apelos da bela moça esvoaçante. Não se sabe ao certo o que se passou pela cabeça do personagem, que não pode ser caracterizado como vilão ou herói, devido à sua ausência completa de emoções, mas o fato é que o Devorador de Mundos muda o curso de sua nave, vai parar na dimensão de Mephisto e começa deliberadamente a devorar o Inferno!

O apocalipse chega ao inferno pelas mãos de Galactus.

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Fragmento da treta.

Após uma breve discussão – que causa a destruição de galáxias inteiras – Mephisto aceita liberar o Surfista, já que, embora possa fazer frente a Galactus, ele e seu reino são uma coisa só e, caso um morra, o outro também perecerá.

O Desarranjo de Galactus 

Darkseid vs Galactus – O Devorador (1997)

A trama se passa quando o Surfista Prateado ainda é um arauto de Galactus e o filosófico personagem encontra nada menos que Apokolips para ser o banquete da entidade galáctica. Talvez por isso ele tenha aparecido de bermuda. Cortesia de John Byrne, responsável por roteiro e arte, inspirado pela pergunta de um leitor gaiato durante uma convenção.

Até o Galactus ficou indignado.

Depois de muita porradaria entre o Surfista, os parademônios de Darkseid e a galera de Nova Gênese, Galactus consegue finalmente aterrar sua máquina processadora de planetas para desfrutar de sua refeição, que consiste sempre em drenar a energia vital que dá vida a toda a esfera celeste. Mas ele descobre, para sua frustração, que Apokolips NÃO possui força vital.

Você já viu Galactus de bermuda?

Após uma rápida explicação de Darkseid, o déspota intergalático enxota Galactus (a quem se refere com cortesia como Deus das Estrelas) naquele típico momento ”olha bem na minha cara”. Em um raro momento de humildade, o imperador de Apokolips diz que, embora ambos se vangloriem como mestres, não são mais que escravos de suas próprias funções e desfere o argumento final: “Deixe o meu mundo, Deus das Estrelas. Não há nada aqui pra você.”

Galactus então se retira com o rabo entre as pernas e o Surfista a tiracolo. Mal sabe ele que se livrou de uma baita diarreia!

Por que matar, se pode sacanear? 

Lobo & Deadman – O Canalha e o Careca (1999)

Lobo vai pra a Califórnia, onde o fantasmagórico Deadman (que felizmente não saiu como Desafiador nessa história), está curtindo a vida numa boa, após ter possuído o corpo de um surfista e descolado três gatas na praia…

Minutos antes da desgraça acontecer.

A verdade é que o caçador de recompensas espacial está atrás de Deadman para capturá-lo e sabe onde o fantasma se esconde, graças a um detector de fantasmas. Deadman então possui Lobo com muita dificuldade e descobre que ele também não sabe quem o contratou, mas uma Caixa Materna dá algumas pistas sobre o responsável e está programada para levar o caçador de recompensas de volta à origem do pedido.

Deu ruim…

Ambos vão parar em Apokolips (parecido com o inferno de Mephisto, nesta história) e descobrem que Darkseid está por trás de tudo. Seu assecla aqui não é o tradicional puxa-saco Desaad, mas um tal Doutor Kroolman, que tenciona enviar a alma de ambos para o céu através de uma arma psiônica. A partir do momento em que descobrir o caminho para o Paraíso, será fácil invadi-lo, matando as hordas dos melhores guerreiros de Apokolips para que entrem lá como espíritos. Caso falhe na missão, Darkseid exige que Lobo se mate.

Plot Twist.

Para isso, Lobo deve cumprir sua parte no trato e cometer suicídio. Como nunca quebra sua palavra, o Maioral aceita se matar após uma lauta refeição. Mas Deadman consegue escapar e possuir a espaçomoto de Lobo que, após ressuscitar, desce a porrada em geral. Ainda deixa um presentinho para o déspota: a Caixa Materna programada para saltar 43 vezes pelo espaço. Pelas palavras do próprio maioral, “até o inferno!”

Máskara, mostra a tua cara! 

Lobo & Máskara (1998)

Lobo é contratado para caçar um famigerado assassino que saqueou uma dúzia de mundos, massacrou governos inteiros e destruiu várias frotas estelares. O que ele não sabe é que não se trata de uma pessoa em si, mas de um objeto deveras belicoso. Pensando bem, o hermetismo da última frase poderia me render um frag pelas mãos do próprio Maioral…

Eis que o Lobo encontra o rei da zoeira.

O mercenário vem à Terra e algum desavisado já se apossou, ou melhor, foi possuído pela máscara. Muita porrada e esculhambação mais tarde, Lobo acaba por descobrir que não está enfrentando um adversário, mas o objeto que está em sua face, algo que pode ser bastante útil, já que o deixaria ainda mais indestrutível, se é que isso é possível. 

Depois de muito se divertir de sua forma peculiar, Lobo percebe que não está usando a máscara, mas sendo usado por ela. Perambulando após se livrar do simbionte carnavalesco, acaba esbarrando consigo mesmo e se toca de que foi contratado para caçar a si mesmo, devido aos estragos que causou enquanto estava dominado.

Não era amor, era cilada.

Explicando, ao ter passado por um buraco negro, Lobo voltou no tempo e foi contratado para caçar ele mesmo quando havia feito aquilo no futuro. Lobo prende o seu alter-ego espaço-temporal, pintando a cara dele de verde para que fique igual ao Máskara e reclama sua recompensa.

Paradoxos à parte, difícil saber quem tirou onda com quem, Lobo ou Máskara, e ainda tem o fato do próprio Maioral ter ferrado consigo mesmo!

Quem é o Maioral? 

Hitman / Lobo – Esse Estúpido Putardo (2001)

Lobo vai beber umas no boteco que é a segunda casa do assassino profissional Tommy Monaghan – o Hitman – e, como todo bom valentão, começa a zoar com todo mundo. De saco cheio, Hitman resolve dar uma lição no cara que se diz o Maioral. Com o poder de ler mentes, não é difícil sacar o nível de periculosidade do alvo e saber que ele é capaz de se regenerar a partir de um único pentelho.

Lobo é o típico bebum chato.

Hitman despeja uma garrafa inteira de whisky em si mesmo e dá um tiro em cada olho de Lobo, deixando-o cego, mas capaz de persegui-lo pelo faro. Lobo corre atrás de Hitman pelo gibi inteiro, estilo Coiote e o Papa-léguas, e é usado como arma e escudo contra seus inimigos. Após ser desmaiado com um guindaste de demolição, tem um cachorro morto soldado em sua bunda, é trajado e filmado casando-se com o barman vestido de noiva.

Lobo deficiente visual.

Quando acorda, Lobo vai ao bar tirar satisfação, mas Hitman lhe mostra a fita gravada e ameaça difamá-lo caso reaja. O Maioral então sai do bar furibundo, já que passou por sua primeira derrota moral, ainda correndo o risco de perder a fama de f*dão.

Você se acha o melhor no que faz? O que eu faço também não é legal! 

À Caça de Wolverine / Pequenos Assassinos – Justiceiro & Elektra nºs 4 e 5 (2003)

Com seu humor tarantinesco, Garth Ennis (o mesmo autor de Hitman/Lobo) nos apresenta uma quadrilha de anões que decepa as pernas daqueles que consideram seus inimigos. Durante uma tradicional briga de bar com Wolverine, eles arrastam uma de suas vítimas a um alçapão situado atrás do balcão e o carcaju decide seguir o rastro de sangue. Justiceiro também está atrás da quadrilha e ambos se trombam num encontro que vai dar em porrada na certa.

Wolverine após levar um tiro na cara do Justiceiro.

Como Wolverine também é capaz de se regenerar a partir de um único pentelho, Garth Ennis resolve brincar com o conceito do personagem e faz do Justiceiro seu avatar na hora de tirar onda com o baixinho mais invocado das HQs. Justiceiro dá um tiro na cara de Logan, deixando a face de seu crânio de adamantium exposta durante todo o gibi, no melhor estilo Exterminador do Futuro.

A humilhação de Wolverine.

Muita violência depois, outro disparo é desferindo nos testículos do canadense e, ao final da história, Justiceiro passa em cima de Wolverine com um rolo compressor.  “E ainda dizem que não tenho senso de humor” , destila o personagem no final da briga.

O Resmungo do Justiceiro 

Justiceiro / Batman – Cavaleiros Mortíferos (1996)

Retalho, fiel inimigo do Justiceiro, vai para Gotham City se aliar ao Coringa na esperança de conseguir recursos pra financiar uma cirurgia plástica pra restaurar seu rosto de garanhão, deformado depois de um encontro nada amigável com Frank Castle.

Justiceiro, então, vai atrás de Retalho e se depara com Batman. Aí temos um Anti-Herói Algoz encontrando alguém que, além de Herói (ou Anti-Herói Algoz raiz), é tão durão quanto ele.

Após estragar a nova cara de Retalho (que acabara de sair de uma cirurgia bem-sucedida) com uma granada, Justiceiro está prestes a matar o Coringa com um tiro na cara. Batman não só intervém como tira onda com a cara do sanguinário algoz: imobiliza Justiceiro, prestes a dar o derradeiro tiro que mandaria o palhaço desta pra melhor, coloca-se entre ambos e recomenda a seu arqui-inimigo que fuja.

Justiceiro tenta matar Coringa com um tiro na cara e Batman intervém, imobilizando o anti-herói.
“Já falei que não!”

Possuído de raiva, Frank Castle desfere um soco e Batman gentilmente recebe o sopapo na cara; e ainda tem a pachorra de acalentar o vingador dizendo algo como: “Eu permiti que me desse um soco porque provavelmente você achava que eu merecia”. A raiva de Castle é tão grande que manda mais um, devidamente defendido pelo Morcego enquanto retruca: “Eu disse um!”

Derrubando o agressor logo em seguida, Batman manda o Justiceiro voltar pra Nova York sob a ameaça de jogá-lo na prisão Blackgate, ou mesmo no Arkham, que talvez, segundo o Morcego, seja até mais adequado. Frank Castle termina a história resmungando“Odeio Gotham!”. 

A cicatriz de Spawn

Spawn / Batman (1997)

Trama a toque de caixa para unir o “capa-malvada” das antigas com o novo. Nada melhor que um crossover entre o maior sucesso da Image da época com o sempre popular Batman. Todd McFarlane estava louco para colocar sua cria, Spawn, ao lado das lendas para dar aquele ar de familiaridade com um personagem desconhecido, que carecia de carisma, criatividade e consistência em sua criação. Estava tão animado que até desenhou a edição.

Fragmento da treta.

Frank Miller assina o roteiro e faz Batman esculachar o metido a Cavaleiro das Trevas do beco no melhor estilo “anti-herói aqui sou eu, rapá!”. No início da HQ, o Morcego já exclama que o bom de saber que vai bater em um assassino é que não precisa economizar na força. No final da aventura, diz ao outro que este não tem o mínimo respeito pela vida humana.

Spawn sendo acertado por Batman.

Ao dar as costas ao aspirante a Anti-Herói Algoz, que continua argumentando, dá-lhe um “cala a bocaarremessando um batarangue tão rápido que fica cravado no rosto de Spawn. McFarlane parece ter gostado tanto da “homenagem” que o personagem passou a exibir uma cicatriz remendada nas edições seguintes.

Muita saúde faz mal 

Monstro do Pântano Especial #01 (1999)

Um estranho fungo paira por Gotham City. Aqueles que o respiram – não todos – padecem de uma estranha doença que os faz escalar prédios de forma incessante e obsessiva até chegarem ao topo e desfalecerem, espalhando esporos pela cidade.

Monstro do Pântano e Batman.

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Batman vai investigar e acaba metendo o nariz onde não devia – literalmente! Padecendo da doença, ele então vai à procura do único que poderia salvá-lo: o Monstro do Pântano.

Batman doentinho.

A criatura vegetal limpa os pulmões de Batman, avisando-o de que sua excelente saúde foi a causadora da infecção. Como a maioria das pessoas se expõe a um estilo de vida menos saudável, está menos propensa a adquirir a doença. Steve Bissette mandou esse recadinho politicamente incorreto aos estetas da vida saudável e sem vícios. Cortesia da Vertigo! Relaxa, Batman!


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Claudio Siqueira
Claudio Siqueira

Escritor, poeta, Bacharel em Jornalismo e habitante da Zona Quase-Sul. Escreve ao som de bits e póings, drinkando e smokando entre os parágrafos. Pesquisador de etimologia e religião comparada, se alfabetizou com HQs. Considera os personagens de quadrinhos, games e animações como os panteões atuais; ou ao menos, arquétipos repaginados.

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