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Conheça o Fino do Side Scrolling em Diferentes Épocas
No final dos anos 1980 e início dos 1990, os consoles e seus jogos viviam uma revolução! Tínhamos a consolidação dos jogos em primeira pessoa (first-person shooter) com Wolfenstein 3D (1992), o advento dos adventures sem verbos (os tradicionais pick up, walk to, look at, talk to) com The Legend of Kyrandia e Darkseed, e jogos com gráficos digitalizados como Pit Fighter, Mortal Kombat, Night Trap e Phantasmagoria. Mas hoje vamos falar sobre o side scrolling.
Prince of Persia era diferente: um side scrolling com gráficos em diagonal que davam a impressão de 3D. Tivemos inteligentes batalhas de espada, uma movimentação corporal perfeita e completa do personagem que viria a ser explorada mais tarde no Mega Drive com Flashback e Jurassic Park, além de verdadeiros puzzles para se resolver em cada cena, coisa que é explorada hoje nos jogos dos quais vamos falar.
Simples no visual e na jogabilidade, esta nova safra lançou verdadeiras obras de arte! Como citei aqui, belas narrativas mudas contam histórias sem dizer palavra alguma e entregam jogos inteligentes, divertidos e reflexivos. A movimentação dos personagens protagonistas encarnados pelo(a) jogador(a) lembra a de Prince of Persia em alguns dos jogos que serão citados aqui.
A evolução das fases e o desenrolar das histórias é semelhante aos clássicos adventures: suas plataformas, suas passagens secretas, suas telas correndo, as missões típicas de ter que pegar um item para usar mais tarde… mas em vez de tramas escabrosas que pareciam saídas de filmes B dos anos 1980, temos boas narrativas, que vão se desdobrando à medida que avançamos em suas fases. Então vamos a eles!
Oddworld: Abe’s Oddysee (1997)
No estranho mundo de Oddworld, os Mudokons são escravizados pelos Glukkons e mantidos sob vigilância pelos Sligs. Os Mudokons são verdes e franzinos, os Glukkons parecem industriais, políticos e engravatados em geral e os Sligs são criaturas moles, sem pernas, só com braços, os quais rastejam até suas pernas cibernéticas, que vestem para cumprir sua função de guarda.
Quando percebe que a fábrica em que trabalham de forma escrava processa alimentos com a carne dos Mudokons (como ocorre em Nova Seul no filme A Viagem), o protagonista Abe dá início a uma jornada para libertar seu povo. Com poderes psíquicos que fazem dele o messias de seu povo, Abe pode possuir os Glukkons e os Sligs e forçá-los a abrir portas, interromper o funcionamento de mecanismos e atirar uns nos outros. Abe nunca entra em confronto direto com os inimigos e qualquer pancada o mata. Exato! Não há a tradicional “barra de energia”.
Além dos Mudokons, Glukkons e Sligs, há também os Paramites e os Scrabs, seres irracionais que habitam o Oddworld. Os primeiros são seres aracnoides de comportamento gregário que fogem quando o jogador se aproxima deles, mas atacam e matam quando encurralados; os segundos são centauros sem braços que atacam qualquer membro de sua espécie assim que se deparam uns com os outros, como um peixe beta.
O game ressuscitou o gameplay de Prince of Persia nas movimentações do personagem nas plataformas, além de misturar o clássico Lemmings (já que se trata de resgatar os seus) com uma pitada de Ecco the Dolphin (a comunicação “zen” entre os personagens).
Oddworld: Abe’s Exoddus (1998)
Continuando o sucesso do primeiro game, Abe’s Exoddus traz basicamente o mesmo gameplay com algumas modificações e um desafio um pouco menor. Agora, além de possuir os seres racionais, Abe também pode possuir os Paramites e Sligs e uma outra espécie, os Fleeches, aparece no jogo: são pequenos vermes que devoram Abe inteiro e não podem ser possuídos, provavelmente por seu cérebro ser muito rudimentar. Felizmente, eles são o prato principal dos Paramites que, podendo agora ser possuídos, constituem uma excelente arma contra os Fleeches.
Além da inserção de um novo antagonista e da ampliação dos poderes psíquicos, agora pode-se contatar mais de um mudokkon ao mesmo tempo, o que torna o jogo ainda mais próximo a Lemmings. O cenário de fundo não é mais apenas ilustrativo e, vez ou outra, pode-se caminhar ao fundo da tela para resgatar mais mudokkons, que desta vez aparecem em mais de uma versão, sendo uma delas os cegos (e você não imagina como é difícil guiá-los).
Feed the Head (2007)
Lembra do brinquedo Sr. Cabeça de Batata? Em 2007, a equipe Vectorpark lançou um game pitoresco. Em Feed the Head, o jogador interage com a silhueta de uma cabeça masculina e pode puxar a orelha, a “tampa” da cabeça e, principalmente, o nariz. O olho acompanha a setinha do mouse, chora ao ser clicado e pode ser arrancado (calma, não se trata de nada gore) para se dar de comer à cabeça e voltar ao lugar de olho. O nariz também pode ser arrancado e no lugar surge outro, nem sempre humano, nem sempre… um nariz. Pode ser uma hélice, um canhão(!), etc.
Após uma rápida substituição de narizes, surge uma ramificação com diversas bolinhas, uma de cada cor, que podem ser dadas à cabeça para que as engula. Uma delas é a “certa” (pois as outras não passam de mera ilustração, já que bizarrices ocorrem ao se ingerir cada uma) e, ao ser ingerida, desencadeia uma pequena série de eventos que vão levar ao fim do jogo, que não tem fim, já que volta ao início. Bizarro? É porque você ainda não jogou metade da lista que vamos falar aqui.
Limbo (2010)
Após um imenso hiato, a dinamarquesa Playdead lançou um game que deu o que falar, tanto por sua estética quanto por sua premissa, já que se trata basicamente de… infanticídio(!). É comum o personagem “morrer” durante os jogos e alguns apresentam crianças como protagonistas, mas você não imaginava uma criança (de… quantos anos?) morrer sistematicamente das formas mais gore (agora sim!) possíveis. Empalamentos, mutilações, afogamento… e toda uma sorte de mortes terríveis acompanham o personagem, que sempre desperta no Limbo novamente, já que o continue é infinito.
Não se sabe ao certo onde o personagem está, se está morto e vivendo um loop eterno ou tendo um pesadelo. É um mundo bizarro, habitado apenas por crianças que tentam matá-lo com flechas, lanças e armas brancas rudimentares que parecem ter sido confeccionadas por elas mesmas, o que chega a lembrar o filme O Senhor das Moscas, baseado no romance homônimo. E às vezes, corpos têm de ser usados como balsa para se atravessar a água, já que o personagem não nada.
O jogo é todo nas cores preto, branco e cinza e lembra as pinturas do suiço H. R. Giger (criador do xenomorfo da franquia Alien e das cenas do jogo Darkseed e sua continuação), com o branco gélido comum às suas pinturas. Os comandos são muito simples: andar para um lado ou outro e pegar coisas para interagir com objetos (como os corpos dos garotos), mas a movimentação do personagem nas plataformas e suas armadilhas lembram muito a do vanguardista Prince of Persia.
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Como era comum em antigos games como Vigilante, Ghouls ‘n Ghosts e Prince of Persia, o protagonista busca uma figura feminina: a “princesa”, como n’A Jornada do Herói, de Joseph Campbell. No caso, uma menina, e não se sabe ao certo se é a irmã ou a menina de quem ele gosta. Meu palpite (pra deixar o jogo ainda mais macabro) é que essa menina foi o primeiro amor do garotinho, que cometeu suicídio e foi condenado a vagar eternamente nesse limbo, à procura de seu primeiro amor.
Ah, eu disse que o mundo é habitado apenas por crianças, certo? Bem, há um outro habitante: uma aranha gigantesca da cor branco gélido. E seu encontro com ela constitui um dos momentos mais tensos do jogo. A personagem se tornou tão antológica que virou até um meme a ser repetido em jogos futuros de outras equipes e empresas.
Insanely Twisted Shadow Planet (2011)
Em 2011, a Microsoft Studios resolveu embarcar na onda de games 2D e lançar Insanely Twisted Shadow Planet. Difícil falar seu nome, difícil de escrever, mas ótimo de jogar! Trata-se de uma nave espacial guiada por seres alienígenas e a própria nave em si é o personagem com quem se interage na tela. À medida que se avança no jogo, o personagem vai ganhando armas e apetrechos dignos de Professor Pardal ou Inspetor Bugiganga, que saem da nave quando se seleciona cada um deles.
A história lembra um pouco a de Samorost, da equipe tcheca Amanita Design, e vai sendo contada em pequenas animações no mesmo traço de Meninas Superpoderosas e Jovens Titãs em Ação (o tal do ligne claire), que aparecem como capítulos quando se descobre os achievements.
Após colidir com uma estrela, um organismo alienígena solta esporos que contaminam o planeta dos seres responsáveis pela nave e um astronauta é designado para eliminá-lo. Há o zoom in e zoom out de Limbo e todo o jogo parece ambientado em uma fase de Botanicula, também da Amanita Design. Plágio? Bem, digamos que isso não ocorre com games e estou preparando um artigo sobre isso.
Nihilumbra (2012)
O nome pode parecer estranho e os gráficos deixam a desejar, mas o conceito só não é o mais belo da lista porque em 2018 foi lançado Gris. Em uma dimensão paralela ou talvez na nossa, não se sabe ao certo, há o Vazio, o nada em sua expressão absoluta. Um pedaço do Vazio se torna alguma coisa… alguém, e dá início a um processo de individuação. O protagonista escapa para o que parece ser o nosso mundo, embora não haja nenhum ser vivo, nem mesmo plantas.
A primeira figura com a qual você se depara é um espantalho e o personagem a mimetiza, o que dramatiza o universo interno do personagem. Como não possui cor, assim como o Vazio, ele adquire, em cada fase, o poder sobre determinadas cores que lhes dão as habilidades necessárias para vencer os antagonistas – pedaços do vazio que se desprenderam e se tornaram aberrações. Uma delas foi nitidamente inspirada no Scrab de Oddworld.
Ao se separar do Nada, nosso amigo passa a ser perseguido por ele e, ao fim de cada fase, há a tradicional “fase da tela andando”, dentro da qual o personagem tem de correr para não ser apanhado pelo “vilão” e retornar à vacuidade. No decorrer do jogo, um narrador desencoraja o protagonista, ao mesmo tempo dando o tutorial necessário para que os comandos sejam aprendidos. O nome do jogo é a junção de duas palavras: nihil, nada em latim, e umbra, do latim umbrae; umbral, limiar ou portal de entrada.
Deadlight (2012)
Diretamente da Espanha, a Tequila Works lançou Deadlight em 2012. O mundo não acabou, pelo menos pra nós, mas não para Randall Wayne, um guarda florestal canadense que trabalha numa cidade de sugestivo nome: Hope (esperança, em inglês). O ano é 1986. Após o apocalipse zumbi que se sucedeu há 140 dias, Randall espera encontrar sua esposa e filha no Safe Point em Seattle, a terra prometida para os sobreviventes que não se tornaram zumbis, chamados Shadows (Sombras) no jogo.
Você já viu essa temática várias vezes, mas o que torna Deadlight único é a textura dos gráficos, a movimentação corporal completa à la Prince of Persia, as animações entre os atos que ilustram a história do jogo e a milícia chamada de The New Law (A Nova Lei) – como ocorre em Extermínio (28 Days Later) – que fazem de Deadlight um drama com ação como Céu Vermelho-Sangue. Mas, como estamos no território dos games, o chamamos de Survivor Horror (Terror de Sobrevivência).
Para dar cabo na empreitada, Randall conta com um machado, um revólver, uma espingarda e… um estilingue! Imagina você num apocalipse zumbi com um estilingue. É que, a partir do segundo ato, Randall se depara com um estranho personagem que vive nas galerias de esgoto e se refere a si mesmo na terceira pessoa como The Rat (O Rato). Disposto a dar um propósito aos zumbis (ou ao menos brincar com eles), O Rato desenvolve engenhosas arapucas que podem ser ativadas com uma pequena pedrada, disparada por um estilingue.
Entre um ato e outro, você joga o sonho e o pesadelo de Randall, onde nada demais ocorre além de andar em linha reta da esquerda para a direita até chegar em sua residência. Mas, ao tentar abrir a porta, Randall acorda. O que seu inconsciente esconde? Não vou dar spoilers, mas se atentem para dois filmes e uma HQ: o brasileiro Nina, o irlandês O Canal e Girl, de Peter Milligan. Se você já leu ou assistiu algum destes, deve pescar o plot. Se pescou, não conte pra ninguém!
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Mark of the Ninja (2012)
Em 2012, a Klei Entertainment emplacou um sucesso. Mark of the Ninja conta com uma excelente jogabilidade (diferentemente de seus antecessores, Shank e Shank 2), boas animações no traço ligne claire e uma história interessante. Assim que foi lançado, foi cogitado como “uma mistura de Batman: Arkham Asylum e o clássico Ninja Gaiden“, mas há mais do que apenas dois elementos.
O jogo se dá no estilo stealth e os comandos executáveis são os mesmos da série Manhunt. Skins são liberadas ao se completar achievements e dois poderes são despertados à medida que se avança nas fases, sendo um uma skin. O interessante é que esses poderes vêm de tatuagens feitas a partir da seiva de uma flor.
A ideia da flor sagrada está presente em várias culturas (como a Flor de Lótus) e também em várias obras, como na série sul-coreana Kingdom com a Planta da Ressurreição, em A Noviça Rebelde com a Edelweiss, e em Batman Begins. Alguém sabe o nome daquela flor? É a Papoula? Se souber, favor postar nos comentários.
Knock-Knock (Ready or not here I come) (2013)
A equipe russa recebeu um email-desafio: fazer um jogo totalmente diferente do que já foi feito. O e-mail continha 19 arquivos intitulados “Let’s Play”. Foi aí que surgiu Knock-Knock (Ready or not here I come). O nome do jogo (sem contar o subtítulo) é uma onomatopeia que reproduz em inglês o nosso “toc-toc”, o bater na porta para se entrar. Lembremos que o vampiro ou assombração só entra se você deixar, vide o filme Deixe Ela Entrar.
O personagem de estética exótica, que nem nome tem, precisa passar a noite acordado para não ser molestado pelas assombrações que habitam a sua casa, o que justifica suas olheiras. Mesmo não tendo permitido que elas entrassem, a porta da frente de sua residência se abre sozinha. Contando apenas com uma vela ou lamparina como “arma” e com o “poder” de se esconder, nosso pobre protagonista vai descobrir aos poucos a entidade que está por trás de tais eventos (como na série de filmes Invocação do Mal e Anabelle) e a entidade por trás da entidade.
Neverending Nightmares (2014)
Novamente, temos a figura da musa, da “princesa”, representada na figura feminina que o protagonista busca. Feito todo em preto e branco, com desenhos que lembram o traço de livros infantis, o jogo mostra a jornada de Thomas Smith, que busca a Gabby, e não se sabe ao certo se ela é sua irmã, sua esposa ou sua mãe.
Não apenas ao passar de cada fase, mas várias vezes no decorrer de uma mesma fase, o protagonista acorda novamente dentro do pesadelo, como no Despertar Eterno, realizado por Morpheus no início da saga Sandman e na HQ Providence, de Alan Moore, o que justifica o título do jogo: Pesadelos sem Fim. A ideia é a do Eterno Retorno, trazida de volta da antiguidade por Nietzsche e representada em diversas obras como Corra, Lola! Corra! e No Limite do Amanhã.
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Assim como em Knock-Knock, Thomas carrega uma vela, embora ela não seja a sua única arma. Os poucos objetos coloridos (e, além do preto e branco, as únicas cores são vermelho e bege) são aqueles com os quais se pode interagir. Thomas também tem de se esconder como em seu predecessor Knock-knock para não ser apanhado por um bebê velho e gigante que tenta agarrá-lo e matá-lo, embora haja outras assombrações e aberrações no decorrer do game.
Em um determinado momento do jogo, há uma escolha de caminhos que levará a dois finais diferentes, além de um comum às duas escolhas, totalizando três finais. O criador Matt Gligenbach disse ter feito o jogo para expurgar seu quadro de Transtorno Obsessivo Compulsivo e sua depressão.
Matt se casou com uma filipina, o que rendeu a continuação de Neverending Nightmares: Devastated Dreams. Desta vez, o jogador encarna uma mulher grávida que tem que proteger o seu filho dos ataques da entidade filipina Aswang, a qual devora a alma de crianças e fetos. Essa é a versão filipina do Lâmio grego e, de certa forma, até do nosso Jurupari.
This War of Mine (2014)
Desenvolvido pela empresa polonesa 11 Bits Studios, This War of Mine pretende demonstrar os horrores da guerra do ponto de vista dos civis e não dos militares, paramilitares ou terroristas. O jogo foi inspirado na Guerra da Bósnia dos anos 1990 e o objetivo é conseguir sobreviver nos escombros de uma construção abandonada após um bombardeio, em meio a outros bombardeios e a possíveis saques em seu esconderijo – inclusive vindos de membros da equipe.
O jogador tem à sua disposição 12 personagens, dos quais três podem ser escolhidos ou recebidos aleatoriamente, dependendo do modo em que se escolha jogar. Alguns são mais diplomáticos, outros mais habilidosos, outros histéricos, outros desonestos… Deve-se construir coisas como fogão para se cozinhar, cama para se dormir e outras coisas. E onde buscar material? Lá fora, em meio à guerra.
Locais que estão passando por bombardeio não aparecem disponíveis no mapa naquele momento, podendo estar disponíveis mais tarde. Um dos personagens com os quais se escolheu jogar deve ser escolhido para sair em busca de mantimentos durante a noite, enquanto os outros ficam em “casa”, descansando ou se recuperando dos ferimentos.
Enquanto se sai (estando exposto a possíveis ataques, de tiro, porrada e bomba – literalmente), seu esconderijo pode ser atacado ou mesmo um dos aliados pode fugir, matar o outro e roubar tudo. Inclusive, outros podem surgir no meio da noite, pedindo abrigo, e cabe a você aceitá-los ou não.
A interface gráfica da casa foi nitidamente inspirada em Knock-knock e os personagens tem o estilo de Deadlight. No trailer do jogo, há entrevistas de jogadores que narram o drama que é jogá-lo, já que perde-se aliados, como senhores de idade que padecem de fome ou doenças e outros que entram em depressão.
Não desdenhando da premissa, o jogo às vezes se torna monótono e não passa os horrores da guerra a menos que o jogador tenha em si a capacidade de imersão necessária para ler os relatos que se passam entre um acontecimento e outro – inclusive, a morte de um dos membros da equipe.
Inside (2016)
A “continuação” – ou ao menos o sucessor espiritual de Limbo, também da dinamarquesa Playdead – mostra um garoto um pouco mais velho do que o de Limbo adentrando um estranho complexo onde todas as pessoas parecem zumbis, não no sentido de serem mortas-vivas, mas de estarem totalmente absortas, como num estado de sonambulismo.
Além de ser a única criança, o protagonista é o único a usar uma camisa de cor vermelha, o que o identifica – para nós – como diferente dos demais. Os movimentos, como abaixar, correr ou andar de fininho, ocorrem automaticamente, de acordo com a necessidade, e temos novamente a riqueza de movimentos iniciada em Prince of Persia.
Muitas vezes, é preciso fingir a apatia dos demais para não ser detectado pelas estranhas máquinas que executam qualquer um que não se comporte da forma adequada. Vez por outra, um determinado capacete confere ao garoto o poder de controlar um ou mais dos absortos para que atuem no cenário e abram portas ou outros dispositivos, como em Abe e seu sucessor.
O jogo não tem uma explicação razoável e isso é ótimo para que cada um crie sua interpretação, embora a ideia do lumpen guiado por uma voz ativa esteja presente durante todo o game. Não sabe o que é lumpen? Dê uma olhada no link abaixo. De qualquer forma, a ideia de livre-arbítrio e individualidade permeia a trama, com um final surpreendente e devastador.
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Sabe aquela ideia de se fazer um livro, quadro ou música como resposta ao rival, como a diss do hip hop? Eu já comentei sobre isso aqui. Malandramente, a Sand Sailor Studio fez um game muito semelhante para criticar os regimes socialistas. Lançado em 2017, Black the Fall traz a mesma ideia de Inside, mas mostra como os regimes socialistas extirparam o livre-arbítrio. Você concorda? Discorda? Jogue ambos e tire suas próprias conclusões. Depois me conte aqui nos comentários, porque eu não joguei Black the Fall por achar um baita plágio.
Gris (2018)
Gris não é um jogo, é uma poesia! Sim! Gris é o nome da protagonista, ou ao menos parece ser, já que não há diálogos no jogo. Após ser despertada de seu sono quando repousava nas mãos de sua mãe estátua, a protagonista se vê obrigada a vagar pelo mundo, colhendo poderes e estrelas para revitalizar a deusa mãe e elevar-se aos céus através da stairway to heaven criada por elas.
Embora uma coisinha ou outra seja nitidamente inspirada em outras obras, como a mão da estátua ser o bayou presente em Samorost 3 e principalmente o antagonista ter o seu momento Venom, Gris é uma belíssima obra, que representa de forma simbólica o universo feminino. Se a intenção de Neverending Nightmares era representar a depressão e a desolação, como disse seu criador em entrevista, Gris o faz de forma lúdica e com muito mais eficácia, tendo beleza (nos traços, cenário e temática) e ação na medida certa.
O caminhar da protagonista no início lembra Neverending Nightmares, mas a consequente queda de joelhos, seu olhar para cima, seu facepalm subsequente, que dá origem ao andar natural que se sucederá no decorrer de todo o game, já demonstram a ideia de “levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima”, além do conceito de que, a partir de agora, não há mais volta.
Se você é dos tais que acham que Gris é um “jogo de menininha”, está bastante equivocado e é bastante preconceituoso. Gris é uma poesia muda sobre o Sagrado Feminino que merece ser jogada até o fim, com uma trilha sonora que diz tudo sem dizer palavra alguma, concomitantemente com as imagens que a música ilustra. Para se ter acesso à história de sua relação com sua mãe-deusa, é necessário colher todos os 28 achievements do jogo e acessar uma passagem secreta na última fase. Acredite, é de bater palma de pé com lágrimas nos olhos.
Happy Game (2021)
O mais recente game dos checos da Amanita Design não deixa nada a desejar, muito embora este pegue diversos elementos de outros games, de uma forma que a Amanita Design nunca tinha feito. Mas já que eles foram referência para tantos outros, têm todo o direito de fazer o contrário e, desta vez, pescar referências e fazer o seu próprio pot-pourri de referências. Afinal de contas, “ladrão que rouba ladrão…”
Nosso amigo protagonista se vê às voltas com o Despertar Eterno, como em Neverending Nightmares, mas desta vez ele é muito bem pontuado em três arcos distintos, que têm como objetivo encontrar três itens que toda criança ama: sua bola, seu bicho de pelúcia favorito e seu animal de estimação. Ao longo do jogo, tudo aquilo que frustra uma criança e nos parece tão bobo quando crescemos é justamente o que acarreta pequenos traumas e neuroses que serão recalcadas por nós quando adultos, e é nisso que Happy Game se centra.
O gameplay é uma mistura de Botanicula, também da Amanita Design, com Neverending Nightmares, como já citado, mas um olhar mais atento perceberá referências a Limbo, Feed the Head, Insanely Twisted Shadow Planet e até a Lenore, a Linda Garotinha Morta, como cogitei aqui. Isso mostra que a equipe continua com a bola toda! E por falar em bola, você nunca viu a representação de uma partida de futebol de forma tão tenebrosa, mostrando o quão terrível é o esporte aos olhos de quem não gosta.
Slice of Sea (2021)
Um jogo pitoresco até para os que estão acostumados com o que venho falando até agora. O personagem protagonista parece uma mistura do robô de Machinarium com as criaturas de Botanicula, sendo um xaxim vestindo uma calça que o dá pernas, como os sligs de Abe.
Mas isso tudo não compromete o jogo, que tem elementos de adventures antigos como The Legend of Kyrandia ou The Dig, já que muitos dos itens coletados ao longo do game não têm serventia nenhuma e pode-se avançar nas cenas sem se ter resolvido o que era preciso e se frustrar mais tarde e ter que voltar, coisa que não acontece nos games mais recentes.
Diferentemente dos adventures da Amanita Design ou de outros que citei aqui, como Gris, não há o contraste da atmosfera lúgubre com o “fofinho”, mas uma união dos dois extremos em algo neutro, que não é triste nem “fofo”.
O cenário mescla perfeitamente um universo extremamente tecnológico com a atmosfera retrô e cogitamos ser o nosso mundo num cenário pós-apocalíptico, para depois essa hipótese cair por terra ao conhecermos os outros habitantes que, estranhamente, não interagem com o protagonista e agem como se ele não estivesse ali. Objetos mágicos e até um “mundo espelho”, como o upside down de Stranger Things, aparecem no decorrer da trama.
Infelizmente, o game é um pouco monótono e as sequências de ir e vir para ativar coisas e angariar itens torna o gameplay confuso, mas é admirável a decupagem do roteiro de Slice of Sea. Do início ao fim, não se tem ideia da jornada do personagem ou o que ele busca, o que só será revelado, é claro, ao fim. A letra da música de abertura dá uma pista, mas, embora você pesque a referência ao objetivo, não faz ideia do que irá presenciar e mesmo o fim ainda deixa dúvidas, embora revele uma única coisa, que não vou revelar aqui, claro.
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