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UMA BAÍA, de Murilo Salles, estreia nos cinemas dia 11 de abril
Murilo Salles diz que UMA BAÍA é um filme difícil de ser sintetizado: “Em nossa primeira versão, o filme tinha sete horas e 20 minutos. Eram oito documentários em suas acepções clássicas. Foi uma inquietação que nos levou a querer fazer um exercício para descobrir no material suas essências poéticas. Depois de um trabalho obsessivo de busca por “imagens” e “sons” que carregassem esse poder de concentração simbólica, nasceram as oito fábulas”.
A Baía de Guanabara é talvez o maior símbolo das contradições do Rio de Janeiro, ao mesmo tempo acolhedora e violenta, bela e assustadora, rica e pobre. Mas foi ao redor dessa baía que a cidade nasceu e cresceu.
Quando vemos o catador de mexilhões em ação no fundo da baía; ou o personagem (quase ausente) que monta um hidroavião com entulhos como latas de cerveja, garrafas pet e pedaços de isopor, ironicamente dialogando com a obra de Rauschenberg; quando vemos um ‘faz-tudo’ prisioneiro em sua própria comunidade, que escapa à noite, pescando silenciosamente na baía. Por fim, os estivadores cochilando em redes esperando seu turno, nesta enorme Oca, que é o armazém do cais 18. Esses personagens são todos descendentes dos índios Tupinambás-Tamoios que aqui viviam quando os franceses vinham ‘extrair’ o “pau-brasil”. Os índios cortavam as árvores e carregavam as toras, enchendo os navios.
Qual a diferença entre um Tupinambá que carregava madeira para as caravelas e um estivador que arcaicamente enche navios com limalha de ferro para a China? Entre o catador de caranguejos hoje, e 500 anos atrás? Da vida que agora levam os quilombolas, e a que levavam seus antepassados?
UMA BAÍA é uma viagem aos lugares originais da baía de Guanabara, testemunha silenciosa, há cinco séculos, de um processo de intensa degradação que afeta diariamente a existência de seus trabalhadores.
O filme estreia dia 11 de abril em São Paulo, Rio de Janeiro, Niterói, Brasília, Curitiba, Recife, Fortaleza, Belo Horizonte e Salvador.
O Paraíso
Em janeiro de 1502, ao entrar na baía de Guanabara em missão de reconhecimento dos territórios portugueses recém-descobertos, o navegador Américo Vespúcio escreveu em suas famosas Cartas sobre o Novo Mundo: “Certamente, se o paraíso na terra está em algum lugar, certamente não deve estar muito longe de onde me encontro”.
Eram os povos indígenas que a chamavam de Guanabara, que na língua de hoje significa “o seio do mar” para alguns, ou “baía que parece um mar” para outros.
Mais de 50 aldeias habitavam os arredores da baía quando os primeiros barcos europeus chegaram. Em poucas décadas os nativos desapareceram, dizimados pela doença, pela guerra e pela própria miscigenação. Depois vieram os africanos. Estima-se que mais de dois milhões de negros, escravos, entraram no Brasil pela Baía de Guanabara e muitos descendentes diretos desse processo colonialista ainda vivem e ganham seu sustento nos mesmos lugares e atividades que seus ancestrais. Como se estivessem presos no tempo, enquanto ele avança.
SINOPSE
Uma Baía observa a Baía de Guanabara no que tem de mais bela, e naquilo que ela oculta, criando fábulas visuais sobe oito personagens que habitam no seu entorno, durante suas lutas pela sobrevivência que dá sentido às suas existências. Vivem a tensão ente a beleza e o espanto.
OITO FÁBULAS
I – A lenta trajetória dos rolos de minério de ferro sendo abduzidos numa mecânica que perdeu sentido e lugar na História. Obra de estivadores, espectadores desatentos de uma História que agora acontece na TV.
II – Em uma longa e cansativa jornada, um catador de caranguejos solitário pega centenas de crustáceos para garantir sua sobrevivência. Caçador e caça acabam virando o mesmo? Mas, o caranguejo precisa fugir de seu destino.
III – O fervor místico de quem é refém de um cotidiano que não se renova. Preso entre suas crenças e seu trabalho, um barbeiro vive à mercê do destino que vai dizer se ele leva um peixe para casa ou não.
IV – Um pedreiro enfrenta uma rotina interminável de trabalho. Cativo desse universo, ele pedala pelos labirintos de sua comunidade para encontrar a salvação nos seus encontros noturnos com as águas da baía.
V – Quilombolas perpetuam a jornada homérico de volta à casa, após a dura jornada noturna de trabalho. Oferecem refeição para a sua comunidade, que elegeu a rua como seu santuário.
VI – O que pode ser construído com o lixo? A improvisação é nossa maior habilidade, mas que sempre fica aquém. Como agora, nossa terra.
VII – Escravizado pelo destino, um cavalo trota. Não há escapatória. Apenas um olhar significativo grita.
VIII – O homem do fundo do mar, que vive do que encontra nos pilares da ponte que atravessa a baía. Sua existência está incrustada na lateral de uma rodoviária, onde as pessoas voltam para casa com o peso de um país que se perdeu na própria História.
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