Festival Curtaflix | Entrevista com diretor Victor Fisch

Victor Fisch é o idealizador do Curtaflix e o Otageek vem trazer para vocês uma entrevista cheia de curtas, inspiração e muito cinema nacional.

Foto do curador e produtor Victor Fisch. Otageek
Victor Fisch, Idealizador do Curtaflix.

O curador Victor Fisch é professor, produtor, diretor e membro do coletivo de produtores Vale Audiovisual, tendo dirigido os curtas-metragens “Gaiola” e “Onde Você Vai?”, premiado no Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo.

Entrevistando Victor Fisch

Primeiro, gostaríamos de saber como foi o processo criativo da seleção dos temas e curtas-metragens que fazem parte da sua curadoria no CurtaFlix e o que te inspirou em cada um deles.

Victor: Toda a ideia do Curtaflix surgiu pela certeza que tenho de que alguns filmes são muito bons e têm totais condições de atingir um público maior que o de festivais.

Um exemplo disso é o filme Guida, de Rosana Urbes, que minha mãe e minha avó são apaixonadas. Comecei minhas sessões por esse filme e pensei em outros que tocariam os corações do público.

Era pra ser uma sessão de emoções mais positivas, mas lembrei dessa lindeza de curta que é o Barqueiro e resolvi colocar ele também, trazendo um outro aspecto de como tocar um coração.

A Rosana também é curadora do Curtaflix, assim como o Pedro Jorge, do curta A Navalha do Avô. Muitos dos curadores que eu convidei são também realizadores e o meu convite de alguma forma se relaciona com os olhares que eles apresentam nos filmes.

Por isso montei a sessão “Curtas para entender o Brasil”, com três curtas realizados por curadores. São filmes que discutem machismo, jogo político, maternidade e periferia.

Já a sessão de “Curtas estranhos que vão te prender na tela” tem alguns de meus filmes favoritos. São curtas surpreendentes, que sempre ficam entre os que me marcam na memória.

Eu já tinha a ideia de trazer ‘Fantasmas’ e ‘Boa Noite, Charles’, que são dois curtas que eu adoro, e pensei nessa composição com o clássico do Kléber Mendonça Filho, Vinil Verde, e um curta que talvez seja o mais inusitado e desconhecido de minhas sessões, o 10-5-2012.

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Quais curtas você destacaria para quem não está habituado a assistir curtas-metragem?

Victor: Vou sugerir 5 curtas do Curtaflix que costumam fazer sucesso com um público mais amplo, tentando não citar os das minhas próprias sessões: O Melhor Som do Mundo, Virando Gente, As Viajantes, Estamos Todos Aqui e Os Fiéis.

Você também é parte dos festivais de arte Soy Loco Por Ti Juquery e Festival Internacional de Cinema de Surf de Ubatuba. Como você descreveria o trabalho por trás da concepção e do tornar real um festival de curtas e arte?

Victor: Eu tenho a habilidade de enxergar potenciais pouco explorados em determinadas situações. Esses dois festivais que você cita são bons exemplos.

Quando fazia um projeto em Franco da Rocha, observava o Hospital Psiquiátrico do Juquery, um lugar com uma incrível arquitetura e mais de 120 anos de história, no centro da vida de todos que ali moram e em uma cidade periférica, pobre e cheia de estigmas.

Imaginei a potência que um festival de artes teria ali dentro. Ao articular com as pessoas certas e apresentar de forma atrativa para um edital, o projeto aconteceu e segue conseguindo todas as verbas que buscamos.

O caso de Ubatuba é parecido. Me mudei para cá, onde moro atualmente, há três anos. Quando cheguei, já busquei entender como podia trabalhar com cultura, que é o que mais gosto, aqui na região.

Ubatuba é conhecida como a capital do surfe. Tem mais de 100 km de costa, com mais de 100 praias. A oportunidade e potencial estavam ali, esperando alguém juntar a faca e o queijo.

Sessões Victor Fisch no Festival Curtaflix Otageek
Sessões Victor Fisch no Festival Curtaflix.

Em algumas de suas sessões, vemos a delicadeza do quadro da mulher em nossa sociedade, a violência, o julgamento, a dor e a redescoberta. Como você encara a importância da figura feminina em nossa sociedade na arte e que mensagem você propõe em seu recorte artístico às mulheres que seguiram o Curtaflix?

Victor: Para ser sincero, eu gostaria que esse recado fosse aos homens, e não às mulheres.

Eu, como um homem, hétero, branco, de classe média, tive que exercitar muito os ensinamentos de Eduardo Coutinho de “compreender a razão do outro” para enxergar a dificuldade que é ser mulher em nossa sociedade.

Elas estão aí falando disso o tempo todo, gritando, colocando faixas, escancarando por todos os lados, mas nós, homens, parecemos cegos a essas falas.

Uma sábia escritora que é minha amiga, Vilma Arêas, costuma dizer que nós, brancos, somos todos racistas, mesmo que não nos enxerguemos. O mesmo vale para nós, homens: somos todos machistas. É muito importante ter consciência disso. 

Outra visão que se destaca em sua curadoria é a temática de saúde mental e emocional. Propositalmente ou não, a seleção de 10-5-2012, A Navalha do Avô e Lúcida abre o diálogo sobre sentimentos, muitas vezes calados, que ganham visibilidade na arte. Como você imagina que o encarar esse tipo de temática pode instigar seu público a rever conceitos antes enraizados sobre a forma como eles encaram o mundo?

Victor: Gostei da pergunta e da observação. Eu mesmo não tinha feito essa análise da minha curadoria.

Eu acredito que o cinema (e a arte de forma geral) funciona muito como terapia, mas em camadas menos evidentes. Ao se enxergar, você está automaticamente trabalhando suas questões.

Os filmes podem não mudar visões sozinhos, mas um conjunto deles vai nos formando aos poucos. Às vezes, uma cena, uma fala, um olhar, pode ser o desencadeador de grandes transformações.

Eu lembro aqui do filme O Ponto de Mutação (Mindwalk), que foi um divisor de águas na minha formação, não cinematográfica, mas humana

Conte-nos um pouco do seu processo de criação de curtas-metragens, como você imagina o enredo, filmagens e edição.

Victor: Cada projeto tem um processo único, que tem características próprias. De forma geral, eu tenho muitas ideias, muitas referências que vão se acumulando. Quando uma delas está me incomodando há muito tempo, eu dou maior atenção a ela.

Os filmes ficam conosco ao longo da vida, então não dá pra ser qualquer coisa que é transformada em filme. Eu penso também que, no caso do curta, só vale sair para filmar se a proposta está redonda e se tenho condições de fazer o filme.

Isso significa que pode ser um filme sem verba, com verba mínima tirada do bolso ou com alguma verba maior, de edital (que, na verdade, nunca tive para os curtas)

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Como tem sido trabalhar com curtas-metragens em meio à pandemia da COVID19?

Victor: Durante a pandemia eu criei dois curtas, ambos se relacionando com as experiências que tive vivendo de forma isolada. A maior transformação que senti foi na minha conexão com o entorno, com a natureza.

Eu e minha companheira passamos a observar muito mais os pássaros do mangue de nossa janela e vivenciamos intensamente essa relação.

Eu tinha uma rotina de muitas viagens que mudou completamente, então a pandemia acabou forçando a transformação de muitas pessoas, por isso muitos filmes foram feitos e outros tantos virão posteriormente para retratar esse momento.

Como você vê a influência do cinema nacional e a disseminação dos curtas-metragens em nosso país?

Victor: Construir um cinema nacional é uma tarefa árdua, destruir é muito fácil.

Nos últimos vinte anos, estávamos vivendo uma linha crescente de nosso cinema, gerando mais oportunidades, melhorando a qualidade das produções e investindo em roteiros.

Tudo isso foi congelado no governo Bolsonaro. Ainda que a indústria tenha criado suas próprias pernas e ainda possamos ficar um pouco de pé, o risco é grande e a disseminação é muito menor do que poderia.

Ainda assim, vemos uma produção crescente, festivais de cinema espalhados por todo o país e uma grande rede de interessados

Como você descreveria a dificuldade que os curtas-metragens e seus produtores têm enfrentado no Brasil?

Victor: Para o mundo do curta, vejo as coisas um pouco diferentes. Sempre foi uma vida dura, sem verbas e na base da raça, as dificuldades de hoje são as dificuldades de sempre.

Fica claro que a política pública impacta nessa rede quando começamos a ver filmes de determinado estado ou cidade surgindo em peso e com maior qualidade

Para finalizar, o que você gostaria de dizer às pessoas que seguiram o festival CurtaFlix?

Victor: Espero que tenham gostado. Se gostaram, eu peço que abracem o Curtaflix como seu e façam chegar em outras pessoas.

Confira nossa cobertura dos curtas disponíveis no Curtaflix, idealizado por Victor Fisch, clicando aqui!

E então, o que acharam dessa maravilhosa entrevista do Victor Fish? Deixe nos comentários e venha se divertir com a gente!

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Luna | A Patroa da Redação
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