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Crítica | ‘Favela É Moda’ quebra padrões com moda da resistência
Premiado como Melhor Documentário (Júri Popular) e Menção Honrosa (Júri Oficial) no Festival Rio de 2019, Favela É Moda apresenta um novo olhar sobre a moda e sobre a estética da passarela por meio de modelos da periferia. O documentário traz diversas discussões atuais sobre comportamento, desigualdade e paradigmas sociais em uma estética vivaz na realidade da favela.
O longa surge no momento certo na hora certa. Pegando carona no movimento Black Lives Matter, a narrativa representa a luta da moda dentro da favela como um ar de esperança e de mudança para uma realidade distinta da Zona Sul do Rio de Janeiro.
A Jacaré Moda, agência de modelos a qual o documentário faz referência, surgiu na região periférica do Rio com um discurso forte, bem embasado e argumentado pela “Moda da Resistência”. Tudo começou há 14 anos com Júlio César Lima e sua vontade de estudar moda e transcender, mudando a história por meio da luta de quebra de estigmas, oferecendo à moda o que ela já havia ditado tempos antes.
Porém, a faculdade parecia um caminho caro a ser seguido. A solução de Júlio foi fazer de revistas de moda sua escada para a luta, comprada por diversas modelos em sua agência.
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Esqueça qualquer estereótipo de passarela e moda que você conhece. Aqui você encontra cor, empoderamento, beleza, close e luta constante. A Jacaré Moda traz pessoas reais para a passarela, reacendendo a esperança para diversas pessoas como a gente.
Hoje a agência representa muito mais que um projeto solto, ela busca o reconhecimento de pessoas de diferentes padrões em revistas, editoriais e campanhas, atuando como uma consultoria, agência de casting, produtora de moda e comunicação.
Entre elas encontramos Raquel Félix, Rennan Santos, Ana Paula Patrocínio e Beatriz Fortunato, a última um case de sucesso internacional da Jacaré, além de muitos outros nomes.
Querer não é poder
Não se dita a moda, se segue. A constante busca da Agência Jacaré em levar o novo para o mundo da moda se baseia na beleza do oposto social branco, loiro de olho claro. Como mostra o filme, ser modelo é um constante desafio, tanto pela cor da pele negra, quanto por ser morador da favela.
Aceitação, aparência, dinheiro e medo transitam entre as cenas em uma mescla de múltiplos sentimentos, onde vemos a falta de oportunidade para o potencial das minorias.
Romantizar para sobreviver
Favela é forte, construída de pessoas empenhadas e trabalhadoras, mas que tiveram que romantizar sua essência para conseguirem sobreviver a uma realidade sem oportunidades e com desdém da maioria.
O mundo da moda ainda é regido pela elite e isso fica evidente por todo o documentário. Quem está onde está é por um longo histórico social. O morro foi contruído por negros após a abolição da escravidão e estar lá significa ter vencido todos os dias uma luta que derrama sangue ainda hoje.
Trabalhar a moda de resistência é uma tarefa árdua que Júlio, assessor das modelos da Agência Jacaré, revela no decorrer da narrativa. Acompanhamos a trajetória de meninas e meninos em meio à uma dupla jornada de trabalho e estudos, onde ajudar em casa se torna uma obrigação. Para eles, o sonho de se tornar modelo é a possibilidade de oferecer um futuro para a família.
Periferia é cultura, moda é política
O ideal de busca por aceitação pela Zona Sul do Rio de Janeiro é quebrado em vários momentos do longa. Os jovens, que antes buscavam inspiração nas zonas ricas e centrais do Rio, percebem que aquilo não os vestem mais e buscam uma reinterpretação própria de si.
A construção parte da favela para a favela em uma ideal novo, com modelos e estilos heterogêneos que não se misturam com a maioria e com o que se está acostumado.
O que é belo? O ângulo de uma câmera pode mudar tudo e o ângulo que o documentário oferece para a favela é de poder e talento de uma cultura negra forte e expressiva, sem a perda da identidade de saber quem você é, onde você vai e onde quer chegar.
Em resumo, o documentário traz o choque de realidade sobre o mundo da moda. Modelos negros não estão na Zona Sul, estão na periferia, onde encontraram lar e abrigo. A sociedade mudou e busca a periferia para dentro das passarelas, revistas, editoriais e campanhas. Representar um histórico e estar presente como marca integrante faz parte de um ideal não só de Jacaré e sim de todos nós.
Favela É Moda foi exibido online nesta semana pelo Feed Dog Brasil.
Matéria produzida por: Arthur Aguiar através do programa Crie com Otageek!
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