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Como Meninas Malvadas influenciou Moxie – Quando as Garotas Vão à Luta
Em um mundo cada vez mais politizado, sempre falamos sobre como obras importantes se tornam datadas muito rápido. Então, com o lançamento do filme Moxie – Quando as Garotas Vão à Luta pela Netflix, é natural que olhemos para a quantidade de coisas que os filmes anteriores desse gênero nos ensinaram.
Mean Girls (Meninas Malvadas), de 2004, por exemplo, disponível atualmente no Prime Video, é sem dúvida um clássico adolescente. Muito além de uma das maiores fábricas de citações e memes das últimas duas décadas, o longa fala a respeito de rivalidade feminina, relações hierárquicas que existem no colégio e o processo de descoberta da sua verdadeira identidade.
Vamos relembrar o plot dos dois filmes
Moxie (2021) conta a história de Vivian (Hadley Robinson), que começa a perceber os problemas sexistas em seu colégio após presenciar Lucy (Alycia Pascual Peña), a garota nova, sofrer assédio de Mitchell Wilson (Patrick Schwarzenegger), o garoto mais popular.
O longa teve o roteiro escrito por Tamara Chestna (After) em conjunto com Dylan Meyer (XOXO – A Vida é uma Festa), baseado no livro homônimo de Jennifer Mathieu (Kelly Clarkson Show) e dirigido por Amy Poehler (Parks & Recreation).
Para quem não se lembra, em Garota Malvadas acompanhamos a jornada de Cady Heron (Lindsey Lohan), uma garota que estudou em casa a vida inteira, enquanto morava com os pais na África, mas que durante o ensino médio volta aos EUA e é obrigada a estudar em uma escola comum.
Garotas Malvadas teve o roteiro escrito por Tina Fey (30 Rock), baseado no livro de Rosalind Wiseman “Queen Bees and Wannabes” e dirigido por Mark Waters (500 dias com ela).
Mas o que Moxie e Garotas Malvadas têm em comum? E de diferente?
Quase 20 anos separam os dois filmes, e é muito fácil perceber o quanto a mentalidade sobre o que é ser uma adolescente mudou. Além disso, percebemos uma representatividade maior em longas mais recentes, mesmo que esteja longe do ideal.
Porém, as coincidências entre os dois longas já começam em suas respectivas produções. Amy Poehler é a diretora e produtora executiva de Moxie, além de interpretar Lisa, a mãe de Vivian. E ela tem uma carreira muito interessante, que também se relaciona com Meninas Malvadas.
Amy trabalhou durante muitos anos no SNL (Saturday Night Live), tradicional programa de comédia dos EUA, com Tina Fey, que foi a roteirista de Garotas Malvadas e intérprete da Senhora Norbury, professora de Cady.
Amy, inclusive, participou de Garotas Malvadas como mãe da antagonista Regina George. Ela e Tina compartilham vários outros projetos em conjunto, como Irmãs e Uma Mãe Para o Meu Bebê, por exemplo.
Cady e Senhora Norbury na Livraria. Senhora George na formatura da filha Regina George.
Voltando aos filmes, em Garotas Malvadas temos as “Plásticas” como o ponto alto da cadeia alimentar estudantil. Cady aos poucos cede aos comportamentos nocivos que o ambiente lhe impõe, inclusive sacrificando amizades e passando dos limites em vários momentos.
Para melhorar, nada representa melhor a rivalidade feminina do que brigar por um garoto, não é mesmo? E esse é o maior problema de Cady: é apenas por querer ficar com Aaron Samuels (Jonathan Bennett) que ela resolve fazer mal à Regina.
Cady se deixa convencer por Janis Ian (Lizzy Caplan) e Damian (Daniel Franzese), seus novos amigos, a criar um plano para derrubar a Queen Bee (Regina George). As motivações de Janis só são apresentadas no final do filme, envolvendo homofobia e bullying.
Conhecendo as Plásticas. Janis e Damian.
Por outro lado, uma das primeiras coisas que Moxie nos apresenta é uma “votação” sobre os corpos das garotas, coisa que infelizmente também acontece aqui no Brasil. Em muitas escolas, essa situação atrelada ao que acontece com Lucy é o estopim para a revolta de garotas como Vivian.
Ao invés do “Livro do Arraso”, criado pelas Plásticas em Garotas Malvadas, que servia para extravasar frustações e falar mal dos colegas de escola, Vivian resolve criar um fanzine feminista (Moxie) e distribuir entre as garotas no colégio, como forma de inspirar e informar as pessoas.
Então, enquanto Cady aprende sobre uma feminilidade idealizada, dolorosa e na qual garotas sempre serão jogadas umas contra as outras, Vivian passa a entender quem exatamente causa todo esse desconforto e a quem interessa ter meninas e mulheres brigando entre si.
Vivian cria o fanzine. Lucy tenta mostrar a votação machista para a diretora.
De certa forma, Moxie parece uma evolução natural do que nos foi apresentado em Garotas Malvadas. Os dois filmes nos mostram como as discussões se dão em épocas diferentes. Cady precisou entender que as outras meninas não eram suas inimigas para que Vivian pudesse fazê-las se juntar, através da sororidade, contra um sistema sexista dentro da escola.
Em Garotas Malvadas, nós mal temos personagens masculinos. Eles não têm qualquer importância e é como se as meninas fizessem mal a elas mesmas. Aaron está ali para ser manipulado por Regina, que é maldosa apenas porque pode, e Cady está mais interessada em “vencer” a rival, então o garoto nem importa mais.
Já em Moxie nós temos uma participação muito maior do elenco masculino, que é sim responsabilizado pelo machismo que propaga, como é o caso de Mitchell Wilson (Patrick Schwarzenegger). O longa também mostra como o gênero masculino pode se tornar aliado na luta feminista, propondo-se a escutar e apontar quando o amigo está errado, como é o caso de Nico Hiraga (Seth).
Vivian e Seth na sala de aula. Mitchell (antagonista) junto com seus colegas de time e a diretora passadora de pano.
Moxie nos mostra um movimento de garotas entendendo que existe um problema pelo qual elas não são responsáveis acontecendo. E notam também que existe todo um sistema tentando mantê-las presas a essa situação de submissão. Lisa (Amy Poehler), mesmo sem saber, acaba inspirando a filha, através de seu passado feminista, a lutar pelo que é certo.
Mesmo assim, temos personagens como a diretora Shelly (Marcia Gay Harden) e o professor Davies (Ike Barinholtz), que querem apenas colocar os problemas embaixo do tapete para não serem incomodados, mas são pressionados pela turma de garotas até tomarem uma atitude.
Diretora Shelly. Professor Davies.
Já os adultos de Garotas Malvadas, com exceção da senhora Norbury, têm pouquíssima relevância para a história. Os pais de Cady só servem para trazê-la da África de volta aos EUA e a senhora George apenas ajuda a explicar o comportamento egocêntrico da filha. Nem mesmo o diretor da escola, o senhor Duvall (Tim Meadows), tem qualquer controle sobre os alunos.
Piadas que envelhecem mal também estão presentes em Garotas Malvadas, afinal de contas, é um filme de quase duas décadas atrás. O fato de um professor se envolver com alunas menores de idade, ou a homofobia sofrida por Janis, e Damian, por exemplo, não seriam vistos com bons olhos hoje em dia.
Já Moxie é muito mais cuidadoso em questões sensíveis. Temos até uma cena muito importante na qual Claudia (Lauren Tsai) explica para a protagonista porque as duas não se expressam da mesma maneira quanto ao que estão enxergando de errado. Isso é um choque de realidade, inclusive para o público.
Além disso temos Lucy, que apesar de ser coadjuvante, em momento nenhum precisa ser “salva” por Vivian. Ela é ativa, puxa a amiga em vários momentos e não espera a garota branca resolver seus problemas. Aliás, é ela que diz para a protagonista que não vai abaixar a cabeça após sofrer assédio por Mitchell.
Mesmo assim, Moxie poderia se aprofundar muito mais em questões raciais com Claudia, que é asiática, e Lucy, que é negra e latina, ou mesmo em questões de gênero, já que se preocuparam em contratar a atriz trans Josie Totah para interpretar CJ.
O problema é que ainda precisamos de representatividade atrás das câmeras. Assim, esperamos que com o reconhecimento de cineastas cada vez mais diversos em Hollywood, possamos ver uma gama maior de pessoas representadas, seja nas telinhas ou telonas.
Claudia e Vivian no intervalo. Lucy enfrentando Mitchell. Claudia salva o Moxie.
Conclusão
Cady Haron, de Garotas Malvadas, quer ser aceita dentro de uma estrutura que é totalmente desconhecida para ela, pois é a primeira vez que está lidando com pessoas da própria idade. Tudo isso durante um período de autodescoberta, a adolescência.
Porém, precisamos lembrar que, mesmo com a necessidade de um adulto para guiar a mensagem final do filme, ela está ali: a senhora Norbury resume o que precisamos saber sobre rivalidade feminina ao dizer:
“Vocês precisam parar de se chamar de piranhas e vadias. Isso incentiva os homens a fazerem o mesmo.”
Já Vivian, de Moxie, representa uma geração muito mais informada sobre como o sexismo afeta as vidas das mulheres, em especial as adolescentes, diariamente, e quer romper com esse sistema machista. Ela então reúne as amigas e realmente bota a mão na massa.
As meninas da geração z tomam muito mais a iniciativa para resolver problemas dentro do próprio círculo social, do que as millennials, inclusive demonstrando toda a sua pluralidade e pressionando autoridades a fazerem a sua parte.
Cada um dos filmes representa muito bem a época na qual foi lançado. São obras necessárias e extremamente divertidas, lembrando-nos de que ninguém começa a aprender sobre pautas feministas lendo autoras clássicas e a maioria das pessoas não tem acesso a esse assunto de forma satisfatória no colégio.
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